A televisão brasileira na era digital: exclusão, esfera pública e movimentos estruturantes (São Paulo: Editora Paulus) é o título do mais recente livro de César Bolaño e Valério Brittos. Nele, os autores discutem os problemas atuais que mais envolvem a televisão digital no Brasil. Também traçam um diagnóstico sobre a produção televisiva, a indústria cultural, o estado da televisão digital no Brasil e no mundo e comentam sobre as falhas do governo em relação a essa nova tecnologia que chega ao país. A IHU On-LineValério Brittos sobre o tema. A entrevista foi realizada pessoalmente. conversou com o professor
Valério nos fala sobre as possibilidades de democratização que a TV digital pode ou não proporcionar à indústria cultural e jornalística brasileira e, ainda, sobre as exclusões que a tecnologia pode trazer a um país em que 97% da população possui televisão em casa. Ele comenta também a respeito do modelo de TV digital que se instala no país e os avanços que os experimentos feitos já trouxeram às programações. “Essa TV digital acaba estruturando o mercado como um todo. Ela nem iniciou e ela já exerceu uma série de influências/provocações em outras mídias. E, quanto mais estiver avançada a TV digital, mais ela vai repercutir sobre as demais mídias, sobre a internet, o próprio jornal”, acredita.
Valério Cruz Brittos é formado em Direito, pela Universidade Federal de Pelotas, e em Jornalismo, pela Universidade Católica de Pelotas, com especialização em Ciências Políticas. É mestre em Comunicação, pela PUCRS, e doutor em Comunicação e Cultura Contemporânea, pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente, é professor do PPG de Comunicação da Unisinos e presidente da ULEPICC - União Latino-americana de Economia Política da Informação, Comunicação e Cultura.
Confira [partes d]a entrevista.
IHU On-Line - O senhor acredita que a TV digital vai democratizar a produção cultural e jornalística da televisão brasileira?
Valério Brittos - Não, a TV digital, por ela própria, não democratiza nem transforma nada. Só haverá democratização se as pessoas a aproveitarem com o objetivo de realizar algumas mudanças importantes que precisam acontecer. E, para isso, é necessário haver regulamentação específica, participação da sociedade, enfim, mudança de comportamento. Até agora, por exemplo, no que diz respeito ao processo de concentração da televisão brasileira – na mão de alguns grupos muito fortes, que fazem o que querem -, nada vai mudar. Por outro lado, leis sobre o controle dos meios, como, por exemplo, a classificação indicativa, ainda não foram feitas.
Pequenos avanços foram dados, mas podemos aproveitar a tecnologia digital para fazer deste momento um momento de fazer mudanças. No entanto, não é a tecnologia sozinha que faz isso.
IHU On-Line – É possível fazer uma previsão do tipo de TV digital que o Brasil está adotando?
Valério Brittos - Pode. Até agora, nós temos pouca ou nada de regulamentação sobre isso e, por conseqüência, não existe uma exigência por parte do Governo Federal em relação aos operadores televisivos sobre qual o tipo de televisão que se terá. Com isso, eles podem fazer o que quiserem. Então, o problema é sério. Para atender aos seus próprios interesses, num primeiro momento, o que os operadores querem é fazer chegar à alta definição. É não transformar a possibilidade da TV digital, os seis megahertz que eles recebem, em multiprogramação. A multiprogramação seria mais democrática, isto é, mais vozes poderiam falar sobre diversos fenômenos, sendo mais “aberta para a sociedade”.
Eu diria que os principais operadores tentarão fazer a programação em alta definição. Essa é a TV digital que nós teremos com alguma coisa de interação, num segundo momento. A TV digital começa em dezembro, por São Paulo, sem interatividade. Como essa legislação está em aberta, pode ainda ser construída alguma regulamentação que imponha obrigações aos operadores de fazerem um dado tipo de TV digital, especialmente através da chamada Lei de Comunicação de Massa. O Brasil vem esperando isso há mais de 10 anos. Se essa lei vier, pode tanto apenas reproduzir as coisas como estão quanto introduzir mudanças.
IHU On-Line - Quais são, atualmente, os movimentos estruturantes que afetam a televisão e os demais meios de comunicação?
Valério Brittos - É que essa TV digital acaba estruturando o mercado como um todo. Ela nem está sendo usada e já exerceu uma série de influências/provocações em outras mídias. E, quanto mais estiver avançada a TV digital, mais ela irá repercutir sobre as demais mídias, sobre a internet, o próprio jornal. Tudo isso em movimentos de conexão, movimentos de convergência, mas que desestruturam.
Toda mídia provoca movimentos estruturantes, e a televisão mais do que qualquer outra. Isso porque ela é a principal mídia do Brasil e do mundo, tendo se tornado o meio de comunicação que as pessoas mais consomem. Internet é muito importante, é claro, mas o que as pessoas consomem mesmo é a televisão, que tem, portanto, um papel estruturante sobre os demais mercados e sobre a sociedade como um todo.
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IHU On-Line - O Ministério das Comunicações diz que o padrão japonês será adotado com inovações tecnológicas e com iniciativas de pesquisadores brasileiros, o que seria um padrão nipo-brasileiro?
Valério Brittos - Ele tem algumas inovações específicas com relação ao padrão japonês. Mas o problema é que esse grau de inovação me parece que não é tão diferenciado, não pelo menos para ser chamado de padrão nipo-brasileiro. Eu diria que, até se prove o contrário, chamá-lo de padrão nipo-brasileiro é marketing governamental. Trata-se de um padrão japonês adaptado às condições do Brasil. Foram feitas várias pesquisas no Brasil sobre a TV digital e se conseguiu avanços tecnológicos bastante interessantes. Mas o problema é o seguinte: qual é o grau de incorporação dessa tecnologia brasileira que vai haver no modelo brasileiro de TV digital? Num primeiro momento, parece que não haverá tanta incorporação desse modelo. Se houver, posteriormente, uma incorporação num grau mais elevado, aí sim pode-se pensar num padrão nipo-brasileiro.
IHU On-Line - O que a população brasileira precisa saber sobre a TV Digital e ainda não foi ou foi pouco comunicada?
Valério Brittos - Precisa saber que essa é uma tecnologia que, por si só, não muda o mundo nem faz revolução. Mas ela pode trazer para o Brasil avanços que ele precisa fazer, resolvendo problemas estruturais do seu mercado de comunicação, que vem de sua origem, na década de 1950. Portanto, a sociedade deve saber que é necessário se mobilizar em torno de uma Lei de Comunicação de Massa, para que esse modelo de TV digital nos faça refletir sobre o ato de midiatizar. O ato de midiatizar deve ser marcado por lógicas públicas, de compromisso com a sociedade, de proteção da infância, enfim, por uma série de elementos para que se tenha a democratização do espaço eletromagnético. E que se possa, além disso, usar a televisão digital para levar conteúdos digitais a pessoas que não têm acesso a dados, a uma certa educação, digamos, eletrônica.
Eu acho que é isso que a sociedade precisa saber: que, se ela não se mobilizar, a TV digital reproduzirá as condições desiguais de acesso que nós temos não só na tecnologia, mas também na educação, na saúde, no transporte, ou seja, em muitas coisas.
Notas:
(1) César Ricardo Siqueira Bolaño é doutor em Ciências Econômicas pela Unicamp e pós-doutor pela Universidade de São Paulo. Atualmente, é professor da Universidade Federal de Sergipe onde desenvolve pesquisas com os temas Ciência, Tecnologia, Economia e Comunicação.
Leia na íntegra em http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=9086
Um comentário:
Olá
Bom, legal achar alguém que fale de política.
Meu Blog, não fala especificamente de politica, mas, de um problema, que nós brasileiros, ou parte, estamos enfrentando...aquecimento global, desmatamento ilegal da amazônia e a mais nova ideia de nossos políticos. O começo da internacionalização da amazonia!
BOm, Passa por lá...agradecerei a visita!
abraço
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