Deu na ALAInet:
Brasil Terceiro Congresso do PT
Sem mudar a estratégia, o que muda?
Alipio Freire
O autodenominado "Campo Majoritário" - CM (ou que nome fantasia queira adotar - pois trata-se de prática já absolutamente "legitimada" do ponto de vista mercadológico desde que o PFL transubstanciou-se em DEM) criou a idéia, que pretende consensual, de que o projeto que impôs e capitaneou desde os anos 1980, e que culminou com os dois mandatos presidenciais, é um projeto vitorioso.
A questão, de tão singela, é cansativa. Até os tontos percebem:
Vitorioso para quem, cara-pálida?
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E mudanças estruturais para uma agremiação onde todas as correntes reafirmam, em suas 12 teses (inclusive o CM), a questão do "socialismo democrático", implica necessariamente discutir a questão das relações de propriedade, e da concentração de riquezas. Ou é isto, ou não há por que falar em socialismo. Ou é disto que falamos, ou mergulhamos todos no perigoso terreno da empulhação e da galhofa.[ . . . ]
Mas, se falamos a sério, a incompetância na formulação da estratégia é mais grave que a ambigüidade acima apontada. Ainda supondo, apenas para efeito do raciocínio abstrato, que o CM tem a intenção de proceder as tais mudanças estruturais, o mais espantoso e estarrecedor é a própria definição do terreno principal de luta: a instituição - onde o inimigo é o mais forte. Reza um velho princípio da arte da política e da guerra, que devemos sempre procurar trazer o inimigo para combater no terreno onde somos (ou podemos vir a ser) os mais fortes, subordinando as lutas em outras frentes às necessidades de avanço e consolidação das lutas travadas no terreno definido como principal. Pelo menos no contexto que vivemos, nos parece óbvio que o nosso terreno privilegiado de luta são as ruas e as praças, ou seja, o da organização e expressão do povo organizado, dos trabalhadores reunidos em suas organizações classistas autônomas e independentes, sejam de caráter sindical, de bairros etc.. E a estratégia do PT-CM inverte a equação. Quanta incompetência! - é a primeira expressão que nos ocorre: colocar o centro da luta no terreno onde a classe trabalhadora e o povo são mais fracos, subordinando o desenvolvimento das organizações e lutas de massa aos interesses da instituição controlada por adversários e inimigos.[ . . . ]
Mas foi sob a batuta dos dirigentes do CM, que o PT conseguiu a proeza de eleger um governo democrático e popular em pleno refluxo dos movimentos e organizações dos trabalhadores e do povo, contrariando tudo o que ensina desde sempre a história política (e política é a luta das classes, frações, setores, segmentos de classes na defesa e disputa dos seus interesses). Ou seja: o Partido dos Trabalhadores chega à Presidência da República sem movimentos populares fortes, sem a classe trabalhadora em cena. Mistério! - logo pensamos, abandonando os saberes acumulados a respeito do assunto e nos entregando às especulações mágicas, ou às tortuosas teorizações ad hoc, para justificar o "milagre" - há sempre um que outro teórico de plantão para o malabarismo circense do circular em torno do "poder" a qualquer preço, ainda que depois de usado e alijado se arrependa.[ . . . ]
Ou seja, para realizar o seu projeto, o CM mudou a base social do partido. E não poderia ser diferente.Se alguns aspectos importantes da política de alianças que levou o partido à Presidência persistiram velados, a construção da governabilidade fez-se escancarada. Tendo escolhido chegar ao governo com um suposto programa democrático popular - declaração genérica de intenções que a " Carta aos brasileiros" de 2001 já desmentia in limine, agora é a corda bamba - e os resultados todos conhecemos.
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Ou seja: se o Terceiro Congresso do Partido dos Trabalhadores não for capaz de dar passos no sentido de um giro radical da sua estratégia, terá sido um rito vão, apenas uma legitimação do que vem sendo imposto há mais de duas décadas pelo CM, e cuja face agora se escancara.E, não esqueçamos: os dirigentes do CM são responsáveis por todas essas mudanças na rota do PT e, embora aparentemente incompetentes para conduzir o partido numa política de garantia de direitos e conquistas para a classe trabalhadora e seus aliado (o povo), têm se demonstrado extremamente talentosos e competentes para garantir, a partir desse instrumento que foi criado ma serviço dos interesses da classe trabalhadora, para implementar e consolidar reformas e políticas neoliberais.
Certamente é essa vitória que cantam.
Alipio Freire é membro do Conselho Editorial do Brasil de Fato, é jornalista e escritor; fundador do PT, ao qual permence filiado.
Leia na íntegra em http://www.alainet.org/active/19225〈=pt
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