Deu na Revista Forum, edição 54, set. 2007:
Imagine o Brasil sem a Globo. A questão proposta na capa da revista Fórum desse mês faz alusão ao fim da outorga de concessão da maior rede de televisão do país, em 5 de outubro. A partir do caso Richarlyson e da bizonha sentença do juiz Manoel Maximiano Junqueira Filho, reportagem discute a homofobia que predomina no futebol, tanto no masculino como no feminino.
Por Bia Barbosa [Quinta-Feira, 6 de Setembro de 2007 às 16:38hs]
No próximo dia 5 de outubro, vencem as concessões das principais emissoras de TV brasileiras. Entre elas, estão cinco concessões da Rede Globo – em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Recife e Minas Gerais. Neste dia, caberá ao Executivo federal, por meio do Ministério das Comunicações e da Casa Civil, aceitar ou não os pedidos de renovação, por mais 15 anos, e submeter sua decisão do Congresso Nacional, que tem a palavra final no processo.
O que pouca gente sabe é que tal procedimento, de tamanha importância para o país – é redundante afirmar o papel político, econômico e social que os meios de comunicação, sobretudo a TV, desempenham em nossa sociedade – será nada mais do que um rito burocrático. Mas, para evitar que a data passe em branco, movimentos sociais e entidades ligadas à luta pela democratização da comunicação planejam promover manifestações e chamar a sociedade para debater o modelo das concessões públicas de radiodifusão. Um modelo que contribuiu de forma decisiva para fazer da Globo o império que ela é hoje.
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Maria Eduarda cita ainda como fatores que foram fundamentais para a estruturação da Globo na década de 1960 o famoso acordo com a Time-Life, realizado em 1962, responsável por injetar capital estrangeiro na emissora, algo que ia contra a legislação vigente. “Há um fator mais forte que é a relação entre o empresariado da cultura e governo militar, que era muito orgânica. O governo permaneceu como maior anunciante, o que era um grande instrumento de controle, sendo que a Globo foi a grande captadora de verba publicitária do regime”, sustenta.[ . . . ]
Além de beneficiar a Globo e Sarney, ACM também aproveitou sua estada no governo federal para incrementar sua influência na área da comunicação na Bahia. A maior parte das concessões das emissoras que integram a Rede Bahia são dessa época. Antônio Carlos Magalhães Júnior é o presidente da Rede Bahia. Em 1987, a TV Bahia, do grupo, se tornou afiliada da Rede Globo, desbancando a TV Aratu, que retransmitia o sinal da emissora da família Marinho havia 18 anos.Perpetuação do oligopólio
O processo constituinte não foi somente um palco generoso onde parlamentares receberam concessões para apoiar Sarney. O lobby pesado dos radiodifusores garantiu condições bastante especiais aos prestadores de serviço no rádio e na TV. A Constituição Federal estabelece que, para uma concessão não ser renovada, é necessária a deliberação de dois quintos do Congresso Nacional em votação nominal. E, para ser cancelada, requer decisão judicial, contrariando assim a regra geral da prestação de serviço público.
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Em seu livro A história secreta da Rede Globo, o jornalista Daniel Herz escreveu que a legislação brasileira para a radiodifusão “é carente de definições de princípios” e prende-se “quase que exclusivamente a definições técnicas e a tributações de competência”. “O Código omite-se na definição de princípios que orientem o uso privado desse recurso (...) de domínio público”, afirma.[ . . . ]
A Constituição de 1988 tentou restabelecer o caráter público da comunicação. O artigo nº 221, por exemplo, diz que a produção e programação das emissoras de rádio e TV devem atender preferencialmente a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas – princípios estes definidos desde o CBT; devem promover a cultura nacional e regional e o estímulo à produção independente; e respeitar os valores éticos e sociais das pessoas e da família. Apesar disso, o caminho para o descumprimento de tais normas foi deixado totalmente aberto, dependendo de regulamentação posterior, e por isso os artigos da Constituição referentes à comunicação seguem ignorados pelos concessionários e pelo Poder Executivo.[ . . . ]
Ao longo dos anos, no entanto, ficou claro, pelos sucessivos decretos que alteraram os dispositivos do CBT que o foco para a escolha dos concessionários era meramente econômico. Em 1996, o decreto nº 2.108 estabeleceu para o critério de pontuação que 40% dos pontos da licitação vêm do prazo para iniciar a execução do serviço em caráter definitivo – enquanto 30% vêm do tempo destinado a programas culturais, artísticos e jornalísticos gerados na localidade; 15% do tempo destinado a programas jornalísticos, educativos e informativos e 15% do tempo destinado a serviço noticioso.[ . . . ]
Aliado à ausência de mecanismos claros que impeçam o monopólio dos meios de comunicação – também proibido pela Constituição –, o privilégio ao aspecto econômico das empresas resultou num quadro de elevada concentração da propriedade dos meios no país.[ . . . ]
A ausência de critérios se estende após a obtenção da concessão. A venda de outorgas, por exemplo, permitida por lei, é quase um processo de transferência privada. “Nas transferências, não há nenhum tipo de fiscalização da autoridade pública. Eu sou concessionário, você tem interesse, eu vendo minha outorga pra você ou para qualquer empresa ou pessoa, de acordo com o meu interesse”, explica Lima.Pior na renovação
Na avaliação do professor da UnB, a situação é pior nos processos de renovação das concessões. Além da não-renovação precisar da votação nominal de dois quintos do Congresso, Lima faz duas observações. “Em primeiro lugar, mesmo se as concessionárias ignoraram ao longo dos anos os princípios que regem a radiodifusão, previstos no artigo nº 221, isso não aparece como critério. Em segundo, embora haja uma série de exigências formais e técnicas, de comprovação fiscal da empresa para a renovação, o processo demora tanto que as comprovações perdem a validade. Na prática, as concessões acabam se transformando em propriedade permanente e as renovações são pró-forma”, avalia.
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“Se, para seguir funcionando, uma emissora não precisa que o processo previsto na Constituição chegue ao fim, o que vale na prática é o simples ato de protocolar um documento em que solicita a renovação. E, se o Ministério das Comunicações, por sua morosidade ou incompetência, não dá seguimento aos processos de renovação das outorgas, ele passa, na prática, a invadir a competência do Congresso Nacional, possibilitando às emissoras funcionarem sem terem a sua concessão renovada”, acredita a jornalista Cristina Charão, integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, organização da sociedade civil que luta pelo direito à comunicação.Fórum solicitou ao ministério a informação de se as emissoras que terão sua concessão vencida no dia 5 de outubro haviam encaminhado este pedido. Mas não obteve resposta.
Às escuras
Como já dito, não bastasse a falta de transparência nos processos de concessão e renovação das outorgas, os 15 anos que as emissoras de TV e os dez anos que as de rádio exploram o serviço de radiodifusão são de total “rédeas soltas”. Não há nenhum tipo de fiscalização, por exemplo, se as emissoras destinam o mínimo de 5% obrigatório do horário de sua programação diária à transmissão de serviço noticioso. Ou se respeitam o limite máximo de 25% de seu horário à publicidade comercial. Menos ainda se reservam cinco horas semanais para a transmissão de programas educacionais. Acredite ou não, o decreto que regulamenta o CBT impede que rádios e TVs transmitam programas que atentem “contra o sentimento público, expondo pessoas a situações que, de alguma forma, redundem em constrangimento” e veiculem espetáculos, trechos musicais cantados, quadros, anedotas ou palavras contrárias “à moral familiar e aos bons costumes”. Mais distante da realidade da nossa TV aberta impossível.
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“Isso cria um problema gigante”, afirma Lima. “Há uma contaminação do processo, pelo fato de, tradicionalmente, haver vários parlamentares com interesse direto em jogo, para aprovar ou prorrogar concessões, compondo a CCTCI”, diz. A própria subcomissão de concessões da CCTCI admitiu que, até agora, as renovações eram aprovadas em bloco sem obedecer a nenhum critério. Alguns parlamentares pegos votando em suas concessões alegaram justamente a votação em bloco como defesa.[ . . . ]
Apesar da garantia de Costa, no início de agosto o MiniCom anunciou um recadastramento de todas as concessionárias de radiodifusão. As empresas terão 60 dias para enviar informações sobre composição do capital, quadro de diretores, procuradores com poder de gerência, endereço e nome fantasia. O último recadastramento foi em 1973. Não é demais lembrar que, por lei, qualquer mudança no quadro societário e contrato social da empresa deveria ser solicitada previamente ao Ministério. Sinal de que não foram.
Bia Barbosa, colaborou Glauco Faria
Leia na íntegra em http://www.revistaforum.com.br/sitefinal/EdicaoNoticiaIntegra.asp?id_artigo=934
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