Deu no Consciência.net:Às vezes a gente precisa desabafar um pouco. Escutando entrevistas na CBN, ouvi um desabafo indignado (no sentido parlamentar da palavra), de um deputado dizendo-se escandalizado com o programa Territórios da Cidadania. Como é dinheiro para as regiões mais pobres do país, evidentemente trata-se de uma medida eleitoreira, de uma autêntica compra de votos. Querem declarar o programa inconstitucional.Raramente aparece na imprensa a avaliação concreta dos projetos e programas, como o Territórios da Cidadania. As indignações parlamentares são muito mais coloridas, e fazer contas é mais complicado (...) Política que favorece os pobres sempre renderá votos, pois os pobres são pobres, mas não burros. E são muitos, efeito indiscutível de séculos de política de direita.Por Ladislau Dowbor (*)
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O programa Territórios da Cidadania destina 9,3 bilhões de reais (valor próximo do valor do Bolsa-Família) a 958 municípios situados nas regiões mais pobres do país. Vem sendo preparado desde o início da primeira gestão, através de identificação de territórios a serem privilegiados, no quadro de uma metodologia desenvolvida pelo MDA (Ministério de Desenvolvimento Agrário). A seleção envolveu o baixo IDH, entre outros critérios, e agrupou os territórios segundo o sentimento de identidade efetivamente sentido pelas comunidades interessadas. Assim uma bacia hidrográfica com vários municípios pode constituir um “território” mais significativo do que um município isolado. Isto favorece a apropriação organizada dos aportes pelas comunidades. Foram alguns anos de trabalho.[ . . . ]
O resultado foram 89 propostas descritas no documento-síntese, entregue ao Presidente Lula, e amplamente divulgado nos principais foros de discussão sobre o desenvolvimento local. O documento, com o título “Política Nacional de Apoio ao Desenvolvimento Local” está disponível, entre outros, no meu site http://dowbor.org sob “Artigos Online”. São cerca de 40 p. no computador. A linha geral do documento reflete a demanda: no plano local, além do apoio financeiro, são necessários apoio tecnológico, apoio institucional, sistemas locais de informação e de comunicação, programas de capacitação, programas de geração de emprego e renda e programas ambientais. Em outros termos, necessitamos de um programa integrado de apoio. O que falta ao pobre não é iniciativa, é oportunidade, e isto se organiza. Aliás, a pesquisa nos familiarizou com a riqueza de sistemas de apoio ao pequeno produtor e ao desenvolvimento local que existe em outros países. O MDA também participou do projeto.[ . . . ]
O importante é fazer os recursos chegar. E igualmente importante, assegurar que junto com os recursos cheguem políticas mais amplas de apoio. Lembro-me quantas vezes, em outros tempos, as minhas sugestões em Brasilia de que fossem destinados recursos à base da pirâmide social, pois não só com soja e automóvel se faz desenvolvimento, levantavam o argumento definitivo: eles não sabem administrar, vai haver corrupção. Eu ficava comovido com as preocupações de Brasilia em impedir a corrupção dos pobres.[ . . . ]
O que aprendemos penosamente nas últimas décadas é que sem recursos não se faz nada, mas também que programas de pára-quedas, respondendo apenas à lógica da oferta e não da demanda, são insuficientes. As organizações da sociedade civil têm sido fundamentais nesta apropriação das políticas pelos próprios interessados, como se vê por exemplo no sucesso do programa de cisternas da ASA ou da Pastoral da Criança. Naturalmente, também aqui ouvem-se vozes indignadas (sempre no sentido parlamentar) querendo uma CPI correspondente para investigar ONGs: não estaria muito melhor gerido o recurso na mão de uma empreiteira?[ . . . ]
Por outro lado, dei-me ao trabalho de ler a PNAD divulgada há poucos meses. No conjunto, os resultados são extremamente, e inegavelmente, positivos. Positivos num mar de atraso, atraso que nos reduziu à situação da nação considerada modelo de desigualdade a não ser imitado (“avoid Brazilianization”, comenta-se nos organismos internacionais). O balanço simplificado dos números pode se visto no meu site, sob “Artigos Online”, com o título “Brasil: retrato sócio-econômico”. Apresentar resultados positivos, segundo uma minha aluna, é suspeito: eu devo ser amigo do Lula. O argumento é curioso, apresentar números negativos é mais objetivo?[ . . . ]
Política que favorece os pobres sempre renderá votos, pois os pobres são pobres, mas não burros. E são muitos, efeito indiscutível de séculos de política de direita. Uma oposição que queira travar estas políticas acaba dando um tiro no próprio pé. O país está maduro para um processo modernizador inclusivo. Tentar impedí-lo para quê? Oposição é ótimo: pressionem para que se faça mais.(*) Ladislau Dowbor, é doutor em Ciências Econômicas pela Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, professor titular da PUC de São Paulo e consultor de diversas agências das Nações Unidas. É autor de “A Reprodução Social: propostas para uma gestão descentralizada”, “O Mosaico Partido: a economia além das equações”, “Tecnologias do Conhecimento: os Desafios da Educação”, todos pela editora Vozes, além de “O que Acontece com o Trabalho?” (Ed. Senac) e co-organizador da coletânea “Economia Social no Brasil“ (ed. Senac). Seus numerosos trabalhos sobre planejamento econômico e social estão disponíveis no site http://dowbor.org ; Contato ladislau@dowbor.org
Leia na íntegra em http://consciencia-textos.blogspot.com/2008/04/oposio-qu.html
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