O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.
Joaquim Nabuco, 1849-1910

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segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Fim do “céu de brigadeiro” de Lula?

Deu no Correio do Brasil:
P
or Altamiro Borges - de São Paulo
Até meados de dezembro passado, o presidente Lula era um homem feliz da vida. Ele parecia um
predestinado. Não se cansava de repetir que o seu governo vivia em “céu de brigadeiro”. Aos que
criticavam a ortodoxia da sua política macroeconômica, ele retrucava com ironias. Motivos para
tanto otimismo não faltavam. A economia dava sinais consistentes de crescimento, após o longo
período de “vôos de galinha”. Várias estatísticas apontavam uma tímida melhora no nível de vida da
população mais carente. Todas as pesquisas de opinião confirmavam sua alta popularidade. Já a
oposição de direita encontrava-se perplexa e dividida e a maioria congressual parecia tranqüila.
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Efeitos danosos dos dois choques
As conseqüências destes dois “choques” são danosas. No caso da CPMF, o governo até revelou
certa ousadia ao elevar as alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e da CSLL
(Contribuição Social sobre o Lucro Liquido), o que atinge principalmente os bancos e as grandes
empresas. Mesmo assim, a medida não cobre o rombo e o governo não está disposto a mexer no
superávit primário – nome fantasia da reserva de caixa dos banqueiros. Em compensação, ele já
anunciou cortes em investimentos do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) e arrocho aos
servidores, anulando acordos salariais e suspendendo novos concursos públicos. Medidas tão
impopulares terão seu custo político, com os servidores se mobilizando para greves e protestos.
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Uma nova onda conservadora
Diante do ocaso do “céu de brigadeiro”, a direita neoliberal ficou alvoroçada. Pelos editoriais da
mídia venal, tudo indica que uma nova onda conservadora se abaterá sobre o governo. O velho e
surrado discurso do “ajuste fiscal” voltou à baila. Tucanos e demos (ex-PFL), apoiados na mídia,
exigem “a redução no ritmo de recuperação do salário mínimo, a urgente reforma da previdência, a
contenção da gastança nos programas sociais, o congelamento dos salários dos servidores e a
suspensão dos novos concursos públicos” – aconselhou, em recente entrevista à TV Globo, um
economista vinculado ao PSDB. Em artigo ao jornal O Estado de S.Paulo, o ex-presidente FHC
sugeriu que o governo Lula “coloque as barbas de molho” e “olhe para os gastos sem controle”.
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Mediocridade palaciana?
A não ser que o governo esteja escondendo o jogo, o que seria compreensível, até agora parece que
ele está inerte diante do fim da CPMF e da crise nos EUA. Como se o Brasil ainda vivesse sob o
quimérico “céu de brigadeiro”. O governo rejeita qualquer discussão sobre a redução do superávit
primário e não quer saber do controle dos fluxos de capitais. O presidente do Banco Central,
Henrique Meirelles, aparenta otimismo e bate na tecla do descolamento. Já o PT, partido do
presidente, continua engalfinhado nas suas lutas intestinas, pendendo cada vez mais ao centro, e
nada fala sobre os riscos iminentes. Ambos, governo e PT, deveriam ouvir o recado do ex-porta voz
do presidente Lula, jornalista André Singer, que nunca foi chegado a rompantes extremistas.
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Retomar a iniciativa política
Diante das incertezas sobre os efeitos da crise no coração do sistema capitalista, dos impactos do
rombo da CPMF e, mais ainda, das vacilações e hibridismos do governo Lula, cabe as forcas de
esquerda e aos movimentos sociais uma atitude mais pró-ativa, retomando sua iniciativa política.
Não dá para ficar passivo frente à agenda conservadora da direita neoliberal ou às mesmices do
governo. É preciso unificar bandeiras e concentrar agendas, superando o localismo e a dispersão que
marcam os movimentos sociais na atualidade. Urge unir partidos progressistas e movimentos
sociais, rejeitando o movimentismo que ergue uma muralha entre estes dois atores políticos.
Do contrário, todo o ônus do fim da CPMF e da recessão nos EUA será lançado nas costas do povo.

O manifesto “por uma reforma tributária justa”, assinado por intelectuais, lideranças populares e
religiosas, mostrou o caminho a seguir. Diante do fato concreto do aumento do IOF e da CSLL, não
vacilou em explicitar de chofre seu apoio ao governo por esta “medida acertada e justa, que atinge
os mais ricos e, sobretudo, os bancos, o sistema financeiro e as empresas estrangeiras”. Ao mesmo
tempo, reafirmando a sua independência, os autores exigiram maior ousadia do governo, propondo
a redução do superávit e dos juros e uma “verdadeira reforma tributária”, que diminua o peso sobre
a população e aumente sobre a riqueza e a renda. Além de evitar o reboquismo e o esquerdismo,
o manifesto elegeu uma bandeira – a reforma tributária – que pode unir e colocar em ação os
movimentos sociais e os partidos de esquerda neste ocaso do “céu de brigadeiro”.
Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB e autor do livro “As encruzilhadas
do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2a edição).

Leia na íntegra em http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=133349

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