Deu no Correio do Brasil:
Por Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni - de São Paulo
Quando se pensava que a lição de 2001 já tinha sido aprendida, termoelétricas movidas a gás importado vão sendo empurradas novamente como sendo a única alternativa ao “apagão”. Mesmo que elas aumentem muito as tarifas, e diminuam a competitividade de nossos produtos.
Afinal, onde será que erramos novamente? Por que ainda estaremos dependendo de combustíveis não renováveis, caros, causadores de efeito estufa e importados de regiões de conflito para garantir o futuro do nosso crescimento? Será tudo culpa das leis e órgãos ambientais, como é a voz corrente?Estará mesmo esgotado o potencial hidráulico já dimensionado de 260 mil MW, quando nós ainda só aproveitamos 60 mil MW? Será proibitivo o custo das linhas para trazer essa energia ao sul-sudeste? Ou será que estamos todos muito tranqüilos, pensando que haverá motores a explosão e geradores suficientes para gerar energia elétrica com bio-diesel, quando o “apagão-anunciado” chegar?
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Será que a culpa dessa queda é da legislação ambiental, que já estava em vigor desde 1988? Será que sozinha ela terá provocado, de repente, essa queda brusca de 80%? Seja lá como for, essa “queda na produção” da Aneel foi a causa pela qual, somando os últimos quatro anos, 10.800 MW deixassem de se tornar disponíveis para construção. Mais da metade de uma nova Itaipu. (ver documento)[ . . . ]
Então, se isso for verdade, como explicar que, espantosa e contraditoriamente, nos últimos quatro anos, a aprovação pela Aneel de projetos de pequenas centrais hidroelétricas tenha quadruplicado, saltando de 220 MW/ano até 2002 para 800 MW/ano entre 2003 e 2007?[ . . . ]
Se somarmos grandes e pequenas centrais, veremos que houve uma redução de 50% da aprovação de projetos hidroelétricos pela Aneel no atual governo, já que foram aprovados apenas 1395 MW/ano depois de 2003, contra 2936 MW/ano nos quatro anos anteriores. Isso faz com que em quatro anos, a potencia total que deixou de ser aprovada, comparativamente com os quatro últimos anos de FHC tenha sido de 6164 MW a menos, ou 15% de toda a demanda no horário de ponta![ . . . ]
Outra diferença é que, para diminuir a burocracia e estimular os investidores privados, esses potenciais são concedidos pela Aneel sem licitação, enquanto que as usinas normais são concedidas mediante leilões públicos. Será esse o motivo da grande quantidade de projetos aprovados de pequenas centrais? Será esse um indício de que tenha ocorrido interferência de grandes investidores ou de políticos sobre a agência, deslocando pessoal dos grandes projetos, que tem menos chances de serem manipulados?[ . . . ]
Mesmo assim, é preciso averiguar se os projetos de pequenas centrais foram incorretamente priorizados com designação de mais pessoal a ponto de prejudicar o resultado final, em termos da potencia aprovada. Se isso ocorreu, será preciso verificar se houve uma ordem nesse sentido e de onde terá partido.Ou se foi algo que aconteceu de forma espontânea, pois frente à uma eventual demora de solução problemas ambientais das grandes usinas, os analistas poderiam ter sido deslocados para a aprovação das pequenas, para não ficarem de braços cruzados.[ . . . ]
Olhando agora para o futuro, o relatório de acompanhamento de projetos da agência, informa que estão em análise mais 13 projetos, com 2680 MW e estudos de viabilidade de 10 usinas, totalizando de 16.503 MW em 23 usinas. E que existem 8310 MW em estudos de viabilidade aprovados que ainda não foram leiloados. Estão sendo analisados 220 projetos de pequenas centrais totalizando 2627 MW. Somando tudo, são novos 27400 MW, ou mais da metade de nossa demanda atual no horário de ponta, esperando aprovação da agência.[ . . . ]
Já prevejo que se diga que a culpa é nossa, empreendedores e projetistas, que teimamos em continuar acreditando no crescimento econômico previsto pelo governo e levando para a Aneel analisar, nossos projetos de pequenas centrais.Do mesmo jeito que os passageiros mais pobres, ansiosos por voar, chegaram a ser culpados durante a crise aérea.[ . . . ]
Quanto isso custaria? Quase nada frente aos custos de um novo “apagão”. Principalmente para os mais pobres e sem qualificação profissional, que são os primeiros a serem demitidos em caso de retração da economia. Aliás, nós da classe média, precisamos mudar nosso conceito sobre um “apagão” de qualquer tipo. Pois aquilo que para nós é um “incômodo”, pode significar “olho da rua” para muitos trabalhadores, pais e mães, acabando com os sonhos de milhões de famílias, que os novos empregos apenas começaram a fazer tornarem-se realidade...[ . . . ]
Mas como funciona o processo de obter uma autorização da Aneel para gerar energia? A legislação determina que a agência exija dos interessados, num determinado prazo, um projeto de engenharia. Este, para ser analisado pela agência deve atender uma série de requisitos e contenha estudos topográficos, hidrológicos, geotécnicos e o protocolo dos estudos ambientais. Acontece que alguns interessados querem ganhar muitas autorizações da Aneel, ao mesmo tempo.E para fazer economia, entregam os projetos sem ter negociado a indenização das terras, sem os estudos ambientais completos e sem os estudos de sondagem geotécnica. Isso porque eles querem ter certeza, antes, de que vão ganhar as autorizações, para depois gastar. Outros empreendedores, para produzirem mais energia, constroem suas barragens acima do nível estabelecido no projeto aprovado pela Aneel, inundando não só mais áreas, mas a casa de máquinas das centrais projetadas rio acima.Como era de se esperar, nem o ministério publico nem todos os prejudicados por esses espertalhões se conformam e recorrem à diretoria da Aneel e depois à justiça, atrasando o início da obra por anos e anos.[ . . . ]
Temos fundadas esperanças de que os novos dirigentes da Aneel possam tornar ainda mais transparentes do que já são, os procedimentos de autorizações, conferindo ainda mais isonomia e publicidade à verificação da entrega tempestiva e do aceite dos estudos e projetos, reduzindo a possibilidade de que sejam entregues incompletos, provocando decisões que possam se contestadas no judiciário, principalmente em virtude do não atendimento da legislação, não só ambiental, mas do serviço público. Com certeza, se forem pesquisados, existirão formas para isso ser feito sem violação do sigilo e do direito autoral, que hoje são alegados para evitar que parte do processo de fiscalização seja feita pelos próprios concorrentes, como acontece com as licitações reguladas pela Lei 8666/93.[ . . . ]
Haverão outras, mas essas são providencias essenciais para que os projetos aprovados saiam do papel, livrando o Brasil, suas indústrias e principalmente o seu povo desse “apagão-anunciado”. Que é melhor do que o “apagão-surpresa” de 2001, mas que ameaça o crescimento econômico sustentável, que após tantos anos de retração, com grandes esperanças, estamos hoje experimentando.Engenheiro eletricista, empresário do ramo de consultoria. Foi Diretor de Planejamento e de Distribuição da COPEL; Companhia Paranaense de Energia. Em 2002, trabalhou no grupo do plano de governo do então candidato Luis Inácio Lula da Silva para energia. Desde 2000 é diretor da ENERCONS Consultoria em Energia Ltda (ivo@enercons.com.br).
Leia na íntegra em http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=126896
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