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terça-feira, 28 de agosto de 2007

Economista Explica Achatamento da Classe Média

Deu no Conversa Afiada, do Paulo Henrique Amorim:
27/08/2007 13:22h


O professor do Instituto de Economia da Unicamp Waldir Quadros defende a tese de que, desde 1981, ocorre um achatamento da classe média brasileira (com renda entre R$ 1.250 e R$ 2.500).

Quadros disse em entrevista a Paulo Henrique Amorim nesta segunda-feira, dia 27, que desde a crise da dívida, em 1982, a estratificação social do Brasil piorou (clique aqui para ouvir o áudio).

“Desde a crise da dívida, como o país entrou numa rota de estagnação econômica também vai ocorrer a correspondente estagnação social. É uma questão prática, o país parou de crescer”, disse Quadros.

Segundo Waldir Quadros, “a alta e média classe média está estagnada e descendente e a miserável é assistida e mantida... Por isso ocorre um inchamento da chamada classe C”.

Waldir Quadros define a classe média:

“Então, nesses dados que eu coloquei aí, eu crio cinco estratos sociais... Eu tomei, em 2004, como referência o salário mínimo da época, que era R$ 240, eu coloquei um pouco acima, R$ 250. Então, abaixo de R$ 250 eu considerei ‘miserável’. Entre um e dois salários mínimos, um pouquinho acima desse R$ 250 a R$ 500 eu chamei de ‘massa trabalhadora’. Aí, de R$ 500 a R$ 1.250 eu chamei de ‘baixa classe média’. De R$ 1.250 a R$ 2.500, ‘média classe média’. Acima de dez salários mínimos, ‘alta classe média’”.

Leia a íntegra da entrevista de Waldir Quadros:

Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com o professor Waldir Quadros, ele é professor do Instituto de Economia da Unicamp, pesquisador do Cesit, professor visitante da Facamp. Professor, o senhor vai bem?

Waldir Quadros – Vou muito bem.

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Paulo Henrique Amorim – Professor, eu li os trabalhos que o senhor teve a gentileza de me enviar: “Pnad 2005 – Exuberância Social Inexplicável”, “A Dinâmica da Classe Média”, “Notas sobre a Estratificação Social”. E nós vamos até tomar a liberdade, se o senhor concordar, colocar no nosso site, para que os nossos leitores aqui do Conversa Afiada possam ter acesso a ele. Eu gostaria de, antes de mais nada, tentar nesse espaço, evidentemente precário de uma entrevista por telefone, que o senhor nos expusesse a sua tese sobre o que efetivamente está acontecendo com a estratificação social no Brasil e por que o senhor diz que há uma exuberância social inexplicável com as análises mais comuns que se fazem da Pnad.

Waldir Quadros – Bom, em relação à exuberância inexplicável, ela diz respeito especificamente ao cenário apontado pela Pnad de 2005, pela Pesquisa Nacional de Amostra em Domicílios, do IBGE de 2005. Quando eu situo na série que eu estou analisando desde 1981, 2005 fica totalmente, como eu diria, inexplicável, porque apresenta uma melhoria na estrutura social que não tem nenhum respaldo na realidade. Nem na realidade que nós podemos, vamos dizer, observar a olho nu, então, é uma grande interrogação. Eu, nos meus estudos, estou deixando a Pnad de 2005 de lado. Quer dizer, ela não está interferindo na tendência. Eu estou esperando agora a Pnad de 2006, que vai ser publicada brevemente, deve ser publicada agora em setembro, outubro, e aí isso, (será verificado se o indicador) volta para uma linha normal, o que está acontecendo. Porque a melhoria da estrutura social, que é apresentada pela Pnad de 2005 realmente não tem base racional. Mas...

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Paulo Henrique Amorim – Vamos nos concentrar na sua opinião e não na opinião daqueles com quem o senhor não concorda. Qual é a sua tese?

Waldir Quadros – Olha, o que os dados demonstram, os dados oficiais do IBGE, mas bem analisados, eliminando alguns vieses que estão presentes, principalmente de natureza demográfica, a minha convicção, que os dados revelam, é que há uma piora gradativa da estrutura social. Se nós tomarmos como ponto de partida o final do milagre, o final dos anos 70, início dos anos 80, nós vamos perceber que gradativamente, como tendência geral decorrente do baixo crescimento econômico, que não gera oportunidades de trabalho e renda, o que nós notamos? Um gradativo encolhimento da classe média. Da alta e da média classe média. Como nós vamos estratificar, tem vários critérios, todos eles são aceitáveis, tem alguns critérios, porém, não há uma medida universal de classe média, principalmente quando se toma a renda declarada da Pnad. Mas, com todas as ressalvas, o que nós podemos observar então é isso: um encolhimento da alta e média classe média e, na miséria, fica um resíduo, que é brutal – quase um terço da população – e em torno disso vai oscilando: tem períodos que ela cai, tem períodos que aumenta, mas fica ali um problema sério de quase um terço dos declarantes abaixo do que nós podemos chamar de uma linha de miséria, que é abaixo do salário mínimo, mais ou menos mantido fixo ao longo do tempo. Quer dizer, então esse é o cenário, principalmente na década de 90, a política social tem sido capaz de evitar uma explosão da miséria, que seria esperável numa situação de estagnação econômica, como nós estamos vivendo já há quase 30 anos. A miséria não está explodindo porque as políticas sociais têm dado conta. Fala-se muito do Bolsa Família, ele é muito importante pela dimensão, mas nós temos outros mecanismos redistributivos até muito mais poderosos.

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Paulo Henrique Amorim – O senhor não concorda então com a tese segundo a qual está havendo uma migração das classes, digamos, D e E em direção às classes D e C?

Waldir Quadros – Olha, está ocorrendo alguma coisa embaixo, está ocorrendo. Pouco. E isso, fundamentalmente, porque nesses últimos anos o crescimento econômico avançou. Apesar de nós estarmos na rabeira do crescimento mundial e principalmente dos emergentes, crescer 4% é melhor do que 2,5%, 2,2%. Então, obviamente, isso tem um efeito. Agora, o efeito principal é de não conseguir subir. Na verdade, as classes C e D, a sociedade vai ficando represada, ela não sobe, ela está estagnada. E também tem a queda das classes A e B.

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Paulo Henrique Amorim – Professor, os estudos do Ipea mostram que há uma progressiva melhor na distribuição de renda. O senhor concorda com isso?

Waldir Quadros – Eu acho que aí, vamos dizer, é uma absorção estatística. Estatisticamente está ocorrendo. Agora, vamos explicar o que é isso. Primeiro, está se tomando a Pnad como base desses estudos, que é o dado que todos nós trabalhamos. Agora, não se faz o alerta de que a Pnad não capta a riqueza. Então, a renda gerada pela riqueza, a renda financeira principalmente, não está na Pnad. E essa só tem aumentado. Então, a concentração de renda está crescendo. Quando nós olhamos do ponto de vista da distribuição funcional, quer dizer, a renda nacional, lucros de ganhos financeiros e quando vai para trabalho, para salário e outras remunerações, a remuneração do trabalho vem caindo sistematicamente com os dados oficiais. A participação do trabalho na renda nacional vem caindo. Portanto, está aumentando a concentração funcional. A Pnad só pega a renda do trabalho. Então, nesse segmento de renda, daquilo que sobre da riqueza, vamos dizer assim, aí você tem realmente uma redução estatística da desigualdade. Agora, como nós vamos interpretar? Eles dizem que está melhorando e eu digo que está piorando. Por quê? Porque essa redução estatística da desigualdade significa tão somente: a classe média está sendo penalizada. É o afundamento da classe média e aquela proteção aos miseráveis que produz esse efeito de redução do indicador. A média oculta, na verdade, o cenário de crise. Isso não pode ser interpretado como melhoria das condições sociais.

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Paulo Henrique Amorim – O senhor diz que a renda do rico não é captada...

Waldir Quadros – Exatamente. Ela é subdeclarada. O rico nem recebe, de um modo geral, o recenseador da Pnad, que é uma amostra, não são todos os domicílios, ele se recusa a receber. Se ele receber ele vai transmitir uma imagem de uma pessoa de classe média, de um gerente ou de um diretor de uma empresa e nunca a sua situação social por razões até compreensíveis.

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Paulo Henrique Amorim – Então o senhor está dizendo que está havendo um achatamento do pessoal entre R$ 1.250 e R$ 2.500?

Waldir Quadros – Que declara isso, hein. Não é que ganha.

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Paulo Henrique Amorim – Então nós vamos ter que esperar setembro ou outubro para ter a prova dos nove?

Waldir Quadros – Apenas isso em relação à Pnad de 2005.

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Paulo Henrique Amorim – Então como houve a crise da dívida em 1982, a sua tese – se eu posso atribuir ao senhor o que o senhor não disse – mas a sua tese é que desde a crise da dívida a estratificação social no Brasil piorou?

Waldir Quadros – Exatamente. Desde a crise da dívida, como o país entrou numa rota de estagnação econômica também vai ocorrer a correspondente estagnação social. É uma questão prática, o país parou de crescer. Porque o que nós temos que comparar para ter uma idéia realmente do tamanho do nosso rombo, é o que está nesse artigo “A Dinâmica da Classe Média” e na verdade é um estudo que saiu num livro publicado pela editora da Unesp, Instituto de Estudos Econômicos Internacionais, dirigido pelo Dr. Gilberto Dupas – era bom pôr essa referência, porque eu só mandei o artigo, mas sem o crédito...

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Paulo Henrique Amorim – O senhor chama a atenção no cenário da estagnação para a letargia declinante da renda média familiar brasileira.

Waldir Quadros – Sem dúvida nenhuma.

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Paulo Henrique Amorim – Está bom. “Sofrível desempenho dos rendimentos médios”. Eu vou colocar à disposição dos nossos leitores os seus três trabalhos. Posso?

Waldir Quadros – Pode. Só dar esse crédito para o Instituto de Estudos Econômicos Internacionais.

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Paulo Henrique Amorim – Está ótimo. Professor Quadros, é sempre um prazer falar com o senhor.

Waldir Quadros – Eu que agradeço.


Artigos do professor Waldir Quadros:

Clique aqui para ler o texto "Notas sobre a estratificação social no Brasil - 1".

Clique aqui para ler o artigo "A dinâmica da classe média" que foi publicado no livro Espaços para o crescimento sustentado da economia brasileira, Gilberto Dupas (org.), Instituto de estudos Econômicos e Internacionais, São Paulo, Editora da Unesp, 2007.

Clique aqui para ler o texto "PNAD 2005: exuberância social inexplicável" que foi publicado no boletim eletrônico do Cesti - Carta Social e do Trabalho no. 5.

Leia também:

IPEA: Bolsa Família não é "fábrica de vagabundos"

IPEA: Classe média em vias de extinção

IPEA: Desigualdade e Pobreza no Brasil

Leia na íntegra em http://conversa-afiada.ig.com.br/materias/451501-452000/451657/451657_1.html

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