O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.
Joaquim Nabuco, 1849-1910

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Nova esquerda religiosa e a dialética

Deu no Correio do Brasil:
No seu artigo "Vencer ou vingar", publicado no dia 17/08/08 no jornal o Estado de São Paulo, que trata do debate que está ocorrendo no Brasil sobre o alcance da anistia política decretada pelo regime militar, o professor José de Souza Martins faz uma afirmação sobre a "nova esquerda de inspiração religiosa" que vale a pena refletirmos com calma.
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Após essa constatação, ele afirma: "A substancial diferença entre a velha esquerda e a nova esquerda está no abandono da concepção dialética da história e sua redução a uma concepção maniqueísta e caritativa da questão social. Em relação à velha esquerda, a nova esquerda desconhece completamente o princípio da superação como ponto referencial da prática política e desconhece, em decorrência, o primado do historicamente possível na orientação da ação política. Uma renúncia completa ao reconhecimento de que o historicamente possível se propõe no plano das condições sociais e políticas do agir histórico."
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Uma das características fundamentais dessa "nova esquerda enraizada no pensamento religioso" é a sua espiritualidade que lhe dá força, perseverança e mantém acesa a indignação ética frente às injustiças sociais. Sem essa espiritualidade, as práticas rotineiras (necessárias) nas lutas sociais e políticas nos levariam à acomodação ou letargia; e sem a força interior que brota da experiência espiritual não resistiríamos às tentações do poder, de "status" ou de vida mais "confortável" que a ascensão nas estruturas do Estado, das igrejas, dos sindicatos, dos movimentos sociais ou dos ONGs possibilita (como, infelizmente diversos companheiros parecem ter sucumbido).
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Se a Deus tudo é possível e se há no mundo um grupo que é portador da vontade e do "projeto" divino, então facilmente podemos ver o mundo dividido em dois grupos: os que ainda se mantém na "pureza" do projeto de Deus e os que se desvirtuaram. E diante de um cenário global em que não há muitos sinais visíveis de uma mudança profunda e rápida em direção à sociedade que desejamos, a tentação de se encapsular em um discurso "radical" e romântico que não aceita os limites da ação histórica é muito grande. É sempre tentador e dá muito "ibope" propor soluções mágicas para problemas que não conseguimos vislumbrar soluções reais. (Nisso não há muita diferença entre alguns grupos de pregadores neopentecostais e de libertação.)
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Reconhecer as possibilidades e limites do agir político-social é também uma forma de assumir o mistério da encarnação, de um Deus-Inifinito que entra e aceita as possibilidades e limites do seu momento histórico e da própria história.

Jung Mo Sung é professor de pós-graduação em Ciência e autor de Cristianismo de Libertação e Sementes de esperança.

Leiam na íntegra em http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=142379

terça-feira, 26 de agosto de 2008

A Filha da Revolução disponível para download gratuito

Deu na Revista Forum:

Por Redação [Terça-Feira, 26 de Agosto de 2008 às 18:03hs]

O livro reúne alguns dos textos que fizeram Reed ser considerado por contemporâneos o melhor escritor norte-americano da sua geração. Cada conto é um pequeno retrato de um período especialmente perturbado - o início do século XX. São histórias que se passam no México de Pancho Villa, em Paris durante a Primeira Guerra, na Rússia revolucionária e na Nova York que se transformava na capital do planeta. Mas em vez de falar dos grandes personagens, Reed se dedica aqui aos pequenos acontecimentos. Prostitutas, mercenários pés-de-chinelo, soldados, aventureiros desaventurados, mendigos orgulhosos e aristocratas humilhados.

O Autor
As crônicas de A Filha da Revolução antecederam o clássico Os Dez Dias que Abalaram o Mundo, um marco na história do jornalismo. Considerado quase que o iniciador do jornalismo moderno nos EUA, John Reed morreu aos 33 anos, em 1920, como herói da Revolução Russa. Reed foi proibido de retornar aos EUA.

Os Dez Dias que Abalaram o Mundo virou filme nas mãos de Warren Beatty, que rendeu dois Oscar - Melhor direção (Warren Beatty) e Melhor Ator Coadjuvante (Jack Nicholson).

Faça o download aqui

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Recessão mundial assombra a Europa

Deu no Blog do Miro:

Estudos recentes indicam que o fantasma da recessão mundial, temido desde o estouro da bolha especulativa nos EUA, já assombra a Europa. A primeira nação do velho continente a sentir seus efeitos foi a ex-sólida Dinamarca. Na seqüência, as estatísticas apontaram crescimento negativo também nos dois países motores da União Européia. Pela primeira vez nos últimos quatro anos, a Alemanha registrou queda de 0,5% no Produto Interno Bruto no segundo trimestre, contra 1,3% de crescimento no primeiro. Já na França, a contração do PIB foi de 0,3% no mesmo período.
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Dura aterrissagem da economia

Chris Giles, articulista do Financial Times, foi um dos que alertou para este risco iminente. Para ele, as notícias dos últimos dias causam “certo choque” para os que acompanham a evolução da economia européia. “O grande medo é o de que a atual desaceleração se torne um ciclo vicioso no qual a fraqueza da economia abala o já frágil sistema financeiro. Para muitos, o que parece certo é a veracidade do velho adágio que diz que, quando os EUA espirram, o resto do mundo pega um resfriado. A conversa sobre descolamento – capacidade das economias de se manterem firmes diante da fraqueza norte-americana – se provou completamente falsa”.
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Abalo nos emergentes do Bric
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Roubini é bem mais pessimista do que Chris Giles, que vê vantagens na retração do mercado de commodities dos países chamados emergentes. De qualquer forma, as previsões de ambos, com base nas informações recentes sobre a retração da economia européia, não são nada animadoras. Como diz o ditado, aonde há fumaça, há fogo. O Brasil que se cuide para não arder em chamas.

O quebra-cabeças de Fernando Lugo

Deu no Le Monde Diplomatique Brasil:
Eleito por seu compromisso com mudanças, o novo presidente paraguaio precisa colocar o Estado a serviço das maiorias — o que inclui reforma agrária e tributária. Mas enfrenta um legislativo conservador, e sua base parlamentar é frágil e dividida. Saberá mobilizar a sociedade, para romper impasses?
Carlos Iaquinardi Castro (25/08/2008)

Em 15 de agosto, o ex-bispo Fernando Lugo assumiu a presidência do Paraguai, interrompendo mais de 60 anos de governo do Partido Colorado, o que inclui a longa ditadura do general Alfredo Stroessner. Durante seu período como bispo da região de São Pedo, Lugo manteve forte vínculo com os movimentos sociais, e em particular com o campesinato paraguaio. Dali nasceu seu movimento Tekojoja, do qual surgiu a proposta de apresentar o religioso como candidato presidencial. Lugo renunciou então a sua função eclesiástica sem esperar o consentimento do Vaticano – que tardava – e aceitou participar da disputa. Formou-se a Aliança Patriótica pela Mundança, uma coalização de mais de vinte correntes, que inclui liberais, a Democracia Cristã e o Partido Comunista Paraguaio. Neste conglomerado, destaca-se o Partido Liberal (PLRA), individualmente o mais estruturado e que obteve maior representação parlamentar. Mas esta coalizão tão diversa e o personalismo particular de Lugo entorpeceram a gestação do novo governo e geraram dúvidas sobre seu futuro imediato.

Nas eleições de 20 de abril, Lugo obteve aproximadamente 42% dos votos. Mas seus rivais imediatos — Blanca Ovelar, do Partido Colorado, e o ex-General Lino Oviedo (que também tem origem nas filas coloradas) — somaram, com suas candidaturas, mais da metade (32% e 22%, respectivamente) dos votos depositados pelos cidadãos paraguaios. No Parlamento, o isolamento das forças de Lugo é muito grande. Os colorados têm quase 38% das cadeiras de deputados; os liberais pró-Lugo (PLRA) controlam pouco menos de 34% e 19% estão em poder da Unace, o partido do ex-general Oviedo. No Senado, os colorados têm um terço das cadeiras e as demais forças, um percentual semelhante ao de deputados. Para aprovar qualquer lei, Lugo terá de contar com o respaldo da principal força política de sua coalizão — os liberais —, o que nem sempre é fácil. E, além disso, negociar com pelo menos mais uma das forças com peso no parlamento. Até agora, os contatos e aproximações foram com a Unace do ex-golpista e direitista Lino Oviedo.

O novo presidente terá de perseguir diversos objetivos importantes, nos primeiros meses de gestão. Lugo sabe que a sua anunciada “batalha contra a pobreza” requer recursos, e por isso antecipou que deverá desenhar uma nova política tributária, que supere a atual — fraca e ineficiente. “Só assim", afirmou há alguns dias, "poderá começar a ser quitada a dívida social que se acumulou durante décadas de indiferença e corrupção”. Atualmente, 1,1 milhão, dos 6 milhões de habitantes do país, encontram-se em pobreza extrema, com renda inferior a um dólar por dia.

Outra questão fundamental será renegociar com o Brasil os termos do acordo sobre a usina hidrelétrica de Itaipu, que estabelece o direito a uma divisão igual sobre energia gerada. Mas o Paraguai, com seu escasso desenvolvimento, só utiliza 17% dos 50% dos que lhe correspondem. O resto, vende ao Brasil — um gigante que necessita dessa energia — mas por um preço considerado insuficiente. Algo similar ao que ocorria com o gás que a Bolívia fornecia ao Brasil e à Argentina, renegociado a preços mais justos, depois que Evo Morales assumiu o poder.

Mas não há dúvidas de que o tema de maior transcendência é o da distribuição de terra. Além de ser um problema antigo, Lugo prometeu, durante sua campanha eleitoral, levar adiante uma Reforma Agrária Integral, que modifique a situação presente, em que 12 milhões de hectares, os melhores recursos naturais do país, estão nas mãos de umas poucas famílias e consórcios. As estatísticas assinalam que o Paraguai tem a distribuição de terra mais desigual da América Latina. Centenas de milhares de agricultores lutam há décadas para melhorar as condições de vida. Os proprietários sempre contaram com a cumplicidade policial e governamental para reprimir os movimentos rurais. Mais de uma centena de dirigentes e líderes camponeses foram assassinados nos últimos vinte anos. A quase totalidade desses crimes continua impune, sem responsáveis e condenações.

Estima-se que um pouco mais de 500 famílias possuem 90% das terras, enquanto outras 350 mil famílias carecem delas. Tal situação incidiu na diminuição da população rural nos últimos 20 anos (de 67% para 30%). A migração interna significou um deslocamento da pobreza e da miséria para os bairros de Assunção e outras cidades. Martín Almada, militante social, ganhador do Prêmio Nobel Alternativo da Paz, e descobridor dos “Arquivos do Terror” do Plano Condor, afirma que o problema da concentração de terras em seu país começou realmente quando a Argentina, Brasil e Uruguai prestaram-se aos interesses do império da vez, a Inglaterra, e deram início à chamada guerra da Tríplice Aliança (1865-1870). “Porque no Paraguai, repartia-se a riqueza, não a pobreza, um mau exemplo para a região”. Como conseqüência daquela guerra, e de outra provocada pelos EUA anos mais tarde, (Paraguai contra Bolívia, em 1935), a estratificação social desenhou-se com 5% de ricos (proprietários das terras férteis), 10% de classe média e entre 75 a 80% de pobres.

A investigadora paraguaia Mirta Barreto acrescenta que logo veio a privatização maciça na década de 1950, com a ditadura de Stroessner. E continua: “durante mais de um século, vorazes fatores externos confluiram para expulsar de suas terras os camponeses e os donos originais”. A tudo isso acrescenta-se, mais recentemente, o modelo de monocultura de soja, que agravou o conflito, lançando milhares de famílias na pobreza, provocando desemprego, e imigração. Segundo fontes oficiais, estima-se que 600 mil agricultores foram expulsos de suas terras pelo agressivo cultivo de soja, nos últimos sete anos. Mais de 180 mil paraguaios imigraram para a Argentina.

O Movimento Camponês Paraguaio crê, e tem razões para isso, que chegou finalmente o tempo de justiça. Foi parte fundamental da base que permitiu a vitória da Aliança Patriótica pela Mudança. Na semana da posse de Lugo, cerca de três mil agricultores ligados à Coordenação da Luta pela Terra e Soberania ocuparam uma fazenda arrendada por um cidadão brasileiro em São Pedro, região onde atuou o bispo Fernando Lugo. O dirigente dos sem-terra paraguaios, Elvio Benítez, afirmou que a ocupação "era uma mensagem clara para os que terão a responsabilidade de governar nosso país em benefício de todos". Os agricultores também pressionam para que o Estado elabore um cadastro nacional sobre a distribuição de terras, para contar com dados fidedignos sobre quem são os proprietários e quantos hectares possui cada um. O sociólogo Tomás Palau avalia que no Paraguai cada pecuarista conta com uma média de 2,7 hectares por cabeça de gado, e que os cultivos de soja transgênica ocupam mais de 2,5 milhões de hectares, cujo semeadura mecanizada e cultivo não requerem muitos trabalhadores rurais. Porém, estas medidas encontraram forte resistência por parte dos latifundiários. Cláudia Russer, da Associação de Produtores de Soja, já pediu que o novo governo defina-se frente à "insegurança", e exigiu garantias para a propriedade privada.

Há, ainda, sinais eloqüentes de crise produtiva no setor industrial. O novo governo vai se reunir com a empresa Petropar, que controla a distribuição de combustíveis e está em falência virtual, com uma dívida de mais de 300 milhões de dólares. A empresa INC (Indústria Nacional de Cimento) quebrou e são freqüentes as interrupções, por falhas técnicas, de suas fábricas principais. As ferrovias, algumas das quais abandonadas, representam mais memória que realidade.

Às dificuldades enumeradas somam-se outras, não menos importantes. É fácil prever que a convivência de Lugo com seu vice, Julio Cesar Franco, do Partido Liberal não será fácil. A maioria deste partido opõe-se às nomeações de ministros e ocupantes de postos-chaves escolhidos por Fernando Lugo. Alguns dirigentes do partido acreditam que Franco está marginalizado ou não ter o destaque que, segundo eles, corresponderia ao seu cargo de vice-presidente.

Martin Almada, o vencedor do Nobel alternativo, manifestou dúvidas de que Lugo poderá cumprir seu compromisso de promover a reforma agrária. Afirmou que o novo presidente "enfrentará a força da legislação burguesa, um parlamento retrógrado, uma justiça corrupta e forças armadas cuja mentalidade, formada pela Doutrina da Segurança Nacional, vê o povo como inimigo". Além disso, ele acredita que, nas condições objetivas de hoje, Lugo terá de se limitar a gerir a pobreza, administrando a herança de mais de 60 anos de governo colorado. A menos que se disponha a organizar e mobilizar a maioria silenciosa, composta pelos socialmente excluídos.

Mas também há dúvidas a respeito desta possibilidade. Há poucos dias, Belarmino Balbuena, um dos líderes do movimento camponês e aliado de Lugo nas eleições de 20 de abril, expressou sua oposição à forma utilizada pelo presidente para mobilizar seus apoiadores. Ele acusou especificamente o chefe de gabinete de Lugo, Miguel Lopez Perito,de organizar concentrações populares ao estilo do Partido Colorado, já que os recursos para promovê-las não partem das organizações sociais. Balbuena, que também pertence à Frente Popular e Social, acha que são "maus sinais" do novo governo.

A este panorama complexo, é preciso acrescentar que o resultado das eleições não altera o equilíbrio de poder dos poderosos interesses econômicos e políticos, que tentam manter seus privilégios, regalias e usufruto de concessões obtidas por mecanismos viciados. Vai ser difícil anular estes métodos, já que o tráfico de influências e a corrupção são parte da "normalidade" administrativa. A concentração de poder econômico permite comprar funcionários, ganhar licitações e subornar juízes e procuradores. Para reverter este cenário, será necessário agir com firmeza e dispor dos quadros necessários para gerenciar e supervisionar a transparência e a honestidade. Grande parte da atividade privada está associada de forma inescrupulosa aos orçamentos públicos, em especial às grandes obras. Segundo críticos, todas foram realizadas com superfaturamento e, em alguns casos, descumprimento dos compromissos da licitação.

Entre as batalhas para impor um governo que funcione normalmente e em consonância com a legislação, está a do contrabando. Ninguém arrisca números, mas muitos crêem que esta atividade ilícita, firmemente enraizada no país, movimente muitos milhões de dólares. Também é conhecido o poder dos grupos que controlam o contrabando. Embora não se possa quantificar sua amplitude, é possível imaginá-la a partir de uma informação: o próprio presidente admitiu ninguém quer aceitar o cargo de diretor da alfândega. O engenheiro João Max Rejalaga, candidato, desistiu devido à "falta de garantias para a sua vida." Horas antes, havia recebido ameaças de morte da máfia que controla o contrabando. A mensagem é clara: querem que tudo continue como está. E esse será um dos grandes obstáculos para as aspirações de mudança, não só na alfândega.

Embora durante a campanha eleitoral o ex-bispo tenha se aproximado dos governos do continente que se distanciam (em graus variáveis), da influência norte-americana, há quem duvide que seu governo assuma esta postura. Na própria Aliança, há críticas à presença de ex-funcionários da ditadura Stroessner no círculo mais próximo ao futuro presidente. Além disso, há quem lhe atribua contatos com James Cason, embaixador americano em La Paz, uma delegação diplomática que teve influência decisiva sobre o governo paraguaio nos últimos 60 anos. Há mesmo quem receie o fato de o papa Ratzinger ter concedido a Lugo, em 30 de julho, em decisão surpreendente, a licença há muito solicitada. Os adeptos do presidente rejeitam esta crítica, argumentando que Lugo terá minorita entre os deputados e senadores — e por isso deve agir pragmaticamente, se quiser governar. Lembram também que ele terá de enfrentar uma estrutura administrativa hostil a qualquer transformação.

Tudo isto é verdade — mas também é certo que grande parte do povo paraguaio, a maioria que votou em Lugo, confia de que deixe para trás as formas autoritárias de governo, o clientelismo, as injustiças e o favorecimento aos grandes grupos económicos, entre eles os latifundiários. Para isso, o presidente terá de fazer todos os esforços para romper uma imagem criada por Martin Almada, parafraseando o intelectual brasileiro Josué Castro: “no Paraguai, os ricos não podem dormir à noite, porque têm medo dos pobres; e os pobres também não dormem, porque estão famintos..." Almada ressalta: "há, no Paraguai, uma pobreza explosiva".

A partir das próximas semanas, quando Lugo tomar suas primeiras decisões, as dúvidas começarão a se dissipar.

* Carlos Iaquinandi Castro, redacción de SERPAL.
Extraído de http://diplo.uol.com.br/2008-08,a2578 acesso em 25 ago. 2008.

Um governo sob demanda

Deu no Instituto Humanitas -Unisinos:

Um governo sob demanda.
O impacto das
tecnologias da informação e comunicação na política

Derrick de Kerckhove, pesquisador da Universidade de Toronto, considerado um dos mais criativos pesquisadores em comunicação digital, está no Brasil para o lançamento do livro Do público para as Redes, organizado pelo professor Massimo di Felice, da Universidade de São Paulo. O canadense concedeu a entrevista abaixo trazendo nas mãos um MacBook Air e um iPhone, devidamente protegido por um capa de silicone azul para evitar riscos no frágil corpo de alumínio. “Sou um grande fã da Apple, embora não de Steve Jobs. É semelhante à relação que nutro pelos Estados Unidos: eu gosto da América, mas não do presidente George Bush”, divertiu-se.

O autor de A Pele da Cultura, Connected Intelligence e Global Village (os dois últimos ainda sem tradução em português) se mostrou um otimista quanto aos desdobramentos das relações internacionais e falou sobre a integração entre o ser humano e as máquinas e sobre a evolução da comunicação e das formas de governo.

A reportagem e a entrevista é de Juliana Rocha e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 25-08-2008.

Eis [trechos d]a entrevista.
A internet ainda é anglófona?

O inglês não é mais a língua dominante, mas ainda desempenha e continuará desempenhando um papel forte nas comunicações internacionais.
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Qual seria, então, a influência maior da rede sobre os idiomas?

Tem um papel protetor, mesmo das línguas mortas. Não acredito que irá lapidar a forma como nos comunicamos na direção de um espanglês (fusão de espanhol com inglês) ou outra variação destas. Por que sempre que algo novo aparece insistimos em pensar que irá destruir o que já estava aí? A mídia entra em pânico: “Ó céus, a língua irá morrer, os jornais irão morrer”. Qual é?!
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Como devemos pensar a interrelação homem e máquina?

A questão contemporânea é se existem evidências de uma integração maior e mais profunda, com cada célula se comunicando com cada outra célula viva ou elétrica no sistema. O que podemos dizer é que estamos vivendo a transição da era das mentes e grupos políticos isolados para a era das mentes interconectadas e grupos globais, onde cada rede pode agir e competir por espaço.
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O que é e como funcionaria um governo sob demanda?

Eu não me considero um pensador de esquerda e nem estou dizendo que a internet substituirá o governo. O que proponho, na realidade, é apenas uma maneira de sobreviver mais adequada ao nosso tempo. A municipalidade continuaria nos moldes como já é. Acredito que os impostos permaneceriam para que fosse mantida a infra-estrutura de tráfego e serviços públicos. Mas a esfera federal só seria composta em momentos de crise e teria de ser transparente. Talvez sob a forma de consultores, que poderiam ou não receber salários, e surgiriam quando houvesse conflito entre os municípios. Seria quase como ter o telefone vermelho de volta.

Há algum exemplo já existente que se assemelhe a esse governo sob demanda?

O que vemos na União Européia hoje, que é um sistema maduro, é uma fórmula bastante interessante.

Leiam na íntegra em http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=16273

sábado, 23 de agosto de 2008

Ai dos que crêem no Império

Deu no Le Monde Diplomatique Brasil:
Ainda que muito breve, a guerra entre Geórgia e Rússia revelou algo chocante para o pensamento convencional. Menos de vinte anos após vencerem a Guerra Fria, os EUA já perderam a condição de poder mundial solitário. Na verdade, deixaram até mesmo de ser superpotência...
Immanuel Wallerstein (23/08/2008)
O mundo assistiu a uma mini-guerra no Cáucaso este mês. A retórica, embora apaixonada, foi muito irrelevante. A geopolítica é uma série gigantesca de jogos de xadrez a dois, nos quais os jogadores buscam vantagens de posição. Nestes jogos, é crucial saber as regras que permitem os movimentos. Cavalos não podem mover-se em diagonal.
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É perfeitamente claro, como todo o mundo observou na época, que as regras de Yalta foram revogadas em 1989, e que o jogo entre os Estados Unidos e a Rússia (a partir de 1991) mudou radicalmente. O maior problema desde então é que os Estados Unidos não compreenderam bem as novas regras. Eles proclamaram a si próprios — e foram proclamados por outros — a superpotência solitária. Em termos de regras de xadrez isto foi interpretado como se os estivessem livres para mover-se pelo tabuleiro da forma que bem entendessem. E, em particular, para trazer os antigos peões soviéticos para sua esfera de influência. Sob o governo Clinton, e de forma mais espetacular sob o de George Bush, os Estados Unidos foram levando o jogo dessa forma.
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Duas grandes decisões geopolíticas foram tomadas nos anos de Clinton. Primeiro, os Estados Unidos forçaram bastante, e foram relativamente bem-sucedidos, para incorporar os antigos satélites soviéticos do Leste Europeu à OTAN. Tais países estavam ansiosos por este ingresso, ainda que os Estados-chave da Europa Ocidental — Alemanha e França — relutassem de algum modo. Percebiam que a manobra norte-americana também os transformava em alvo, ao limitar a liberdade de ação geopolítica que recém haviam adquirido.
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Mesmo sob Yeltsin, a Rússia sentia-se descontente com estas duas iniciativas geopolíticas norte-americanas. No entanto, a desordem politica e econômica naqueles anos era tão grande que o máximo que podiam fazer era reclamar — deve-se dizer que de um modo um tanto débil...
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E, é claro, Bush invadiu o Iraque em 2003. Como parte deste envolvimento, os Estados Unidos vislumbraram e obtiveram direitos às bases militares e de sobrevôo nas repúblicas da Ásia Central — que anteriormente faziam parte da União Soviética. Além disso, promoveram a construção de óleodutos e gasodutos que procuravam tornar desnecessários os sistemas russos. E finalmente entraram em acordo com a Polônia e a República Tcheca para estabelecer pontos de defesa de mísseis, sob alegação de defesa contra o Irã. A Rússia, porém, os viu como voltados contra si.
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O presidente russo começou começou a agir. Negociou acordos com. Manteve relações próximas com o Irã. Começou a pressionar os Estados Unidos para fora das bases militares na Asia Central. E se posicionou firmemente contra a extensão da OTAN em duas zonas estratégicas: Ucrânia e Geórgia.
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As causas imediatas para a mini-guerra destes dias têm dupla origem dupla. Em fevereiro, Kosovo institucionalizou sua autonomia de facto. Este movimento foi apoiado por e reconhecido pelos Estados Unidos e por boa parte dos países europeus. A Rússia alertou, na época, que a lógica deste movimento aplicava-se igualmente às secessões de facto nas antigas repúblicas soviéticas. Na Geórgia, a Rússia agiu imediatamente, pela primeira vez, reconhecendo a independência de jure da Ossétia do Sul, em resposta direta aos fstos em Kosovo, Em abril, os Estados Unidos propuseram, durante reunião da OTAN, que a Geórgia e a Ucrânia fossem recebidas, em um plano de adesão chamado Membership Action Plan. Alemanha, França, e o Reino Unido opuseram-se a isso, alegando que seria uma provocação à Rússia.
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Ao invés disso, ele teve uma resposta imediata da força militar russa, que esmagou a pequena armada georgiana. De George W. Bush, obteve retórica. Mas afinal de contas, o que Bush poderia fazer? Os Estados Unidos não são uma super-potência. Suas forças armadas estão atoladas em duas guerras sem perspectivas no Oriente Médio. E, mais importante que tudo, eles precisam muito mais da Rússia do que o contrário. O ministro de Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, frisou, num artigo publicado pelo Financial Times, que a Rússia é um "parceiro do Ocidente no Oriente Médio, Irã e Coréia do Norte”.
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A Rússia saiu, portanto, muito mais forte que antes. Saakashvili apostou tudo o que tinha e está agora geopoliticamente falido. Como nota irônica, a Geórgia, uma das últimas aliadas dos Estados Unidos na coalizão no Iraque, retirou todos os 2 mil soldados que ainda mantinha por lá. Estas tropas jogaram um papel importante nas áreas xiitas, e agora precisam ser substituídas por tropas norte-americanas, que terão que deixar outras áreas.

Quem joga o xadrez geopolítico precisa conhecer suas regras. Do contrário, corre o risco de ficar emparedado.

Leiam na íntegra em http://diplo.uol.com.br/2008-08,a2568

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

STF: Sem preconceito



Ou vejam aqui: http://charges.uol.com.br/2008/08/21/cotidiano-sem-preconceito/

Agua e petróleo, a mesma moeda

Deu no Vi o Mundo:
Por Amyra El Khalili*
A América Latina vive hoje uma guerra intestina, mas silenciosa, em pequenos focos espalhados pelo continente, mas que podem eclodir a qualquer momento num emaranhado de ações e convulsões sociais se não estivermos preparados para novos enfrentamentos econômicos e políticos.
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Se o Oriente Médio sofre por ter seus recursos naturais espoliados, a América Latina sofre com a servidão ao sistema financeiro internacional. Sofre com a usura das altas taxas de juros, a especulação financeira, o endividamento e é vitimada pela corrupção endêmica.
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Construímos na América Latina a nossa cultura americana árabe, agregando valor à cultura miscigenada dos povos latino-americanos. O carisma, a vontade de trabalhar, a diplomacia e nossa maneira de ser deram a nós, árabes e descendentes, uma vantagem comparativa para negociar e realizar parcerias.
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Não faz sentido que os recursos obtidos pela exploração do petróleo árabe funcionem como lastro para o sistema financeiro que hoje os bombardeia.
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Contra uma globalização que tenta extorquir nossos recursos naturais e estratégicos, somente uma nova globalização cultural, inter-racial e inter-religiosa.
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O mundo árabe tem sua economia centrada nos recursos energéticos não renováveis, um “privilégio” pago com milhares e milhares de vidas. Faz-se estratégico e vital migrar para a energia renovável, com todo conhecimento e tecnologia acumulados ao longo de décadas por aqueles produtores de petróleo.
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Infelizmente, pouco exportamos em linha reta para o mundo árabe, pois as rotas de comercialização ou foram reduzidas ou foram fechadas para os países em desenvolvimento. Produzimos laranja no Brasil, exportamos in natura ou suco para a Itália, onde é reprocessada e embalada com a marca "made in Italy" e reexportada para os países árabes. Assim, ficamos com todos os riscos de produção, custos de financiamento, encargos e tributos, enquanto as indústrias estrangeiras ficam com a parte gorda dos lucros.
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Os fundos islâmicos não aplicam em juros, mas podem muito bem financiar a produção de longo prazo, desde que tenhamos também nesses contratos, a contrapartida dos investimentos de base em educação, saúde, agricultura, ciência, cultura, cooperativas de produção, entre outros.
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No âmbito nacional e continental, é vital que parcerias e acordos garantam a preservação e o uso público e social das bacias hidrográficas e águas subterrâneas transfronteiriças. Trata-se não só de uma questão ambiental e social, mas de soberania e segurança internacional. A crise hídrica mundial que se prenuncia pode transformar o ora pacífico continente no cenário de disputas cruentas como as que têm lugar hoje no Oriente Médio.
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A alternativa é a estruturação de uma rede de investimentos, parcerias e comercialização, que garanta o monitoramento, a fiscalização e a orientação de negócios e projetos sócio-ambientais na América Latina.
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Estes são, em resumo, os principais pontos do pronunciamento elaborado por Amyra El Khalili, Eduardo Felício Elias e Além Garcia e encaminhado por Claude Fahd Hajjar ao Primeiro Congresso Fearab América-Liga de Estados Árabes, realizado no Cairo, Egito, entre 10 e 12 de julho de 2006. Esperamos que sirvam de ponto de partida para um amplo debate sobre o futuro deste nosso planeta.

Fontes:

Entrevista por Sandro C. Cardelíquio com Amyra El Khalili - Água e Petróleo, a mesma moeda - para a Revista Eco Spy - Ano 2, n. 07 - Novembro/2006. Editora Risc. www.ecospy.com.br.

Misleh, Soraya. Entrevista com Amyra El Khalili. Do Oriente à América Latina, a cobiça por recursos naturais. Revista Al Urubat - Sociedade Beneficiente Muçulmana de São Paulo. Fevereiro 2007 - nº 785. www.sbmsp.org.sp

El Khalili, Amyra. Elias, Eduardo Felício. Garcia, Além. Boletim 0999 [BECE REBIA] Cúpula do Cairo: Tratado Água e Petróleo, a mesma moeda. Pronunciamento encaminhado por Claude Fahd Hajjar ao Primeiro Congresso Fearab – Federação das Entidades Árabes Americanas e Liga de Estados Árabes, realizado no Cairo, Egito, entre 10 e 12 de julho de 2006 (Documento BECE). 06 de Agosto de 2006.
(*) Amyra El Khalili* é economista, presidente do Projeto BECE (sigla em inglês) Bolsa Brasileira de Commodities Ambientais. É também fundadora e co-editora da Rede Internacional BECE-REBIA (www.bece.org.br), membro do Conselho Gestor da REBIA - Rede Brasileira de Informação Ambiental, do Conselho Editorial do Portal do Meio Ambiente (www.portaldomeioambiente.org.br) e da Revista do Meio Ambiente (www.rebia.org.br). É professora de pós graduação com a disciplina "Economia Sócioambiental" na Faculdade de Direito de Campos de Goytacazes, pela OSCIP Prima Sustentabilidade e MBA pela UNOESC, entre outras. Indicada para o "Prêmio 1000 Mulheres para o Nobel da Paz" e para o Prêmio Bertha Lutz. email: (bece@bece.org.br)

Leiam na íntegra em http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/agua-e-petroleo-a-mesma-moeda/

Entrevista de
Amyra El Khalili para a Gazeta do Povo (Paraná): http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/agua-para-promover-a-paz/

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Barack Obama e o poder da internet

Deu na Adital:
Altamiro Borges *
Adital -
Para todos os que encaram as eleições de 2008 como decisivas no longo processo de acumulação de forças do campo popular e democrático, o texto do jornalista Rodrigo Savazoni, publicado no portal Terra Magazine, serve de alerta e, ao mesmo tempo, dá uma importante dica. Ele revela o papel determinante e até surpreendente que a internet tem jogado na campanha do candidato do Partido Democrata nos EUA. Para ele, já não há dúvida de que a campanha de Barack Obama "é o exemplo mais bem-sucedido do uso da internet para fins político-eleitorais".
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Para reforçar sua tese, ele cita o artigo "Conexão Obama", publicado em maio no The New York Times. "Obama é sedutor, grande orador, um sujeito com uma trajetória irrepreensível. Não fosse a internet, porém, ele nada seria", garante o autor Roger Cohen. Segundo a pesquisa, o candidato democrata já havia conquistado 1.276.000 doadores, 750 mil voluntários ativos e 8 mil grupos de afinidade. "Em fevereiro, quando sua campanha arrecadou 55 milhões de dólares (45 milhões via internet), 94% das doações apresentaram valores menores que 200 dólares". São números que impressionam e mostram a força da internet, inclusive na criativa captação de recursos.
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Resolução draconiana do TSE

O excelente texto de Rodrigo Savazoni tem enorme utilidade, principalmente para os candidatos do campo popular, que não contam com os fartos recursos dos representantes dos ricaços. É certo que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na resolução de número 22.718, assinada pelo ministro Ari Pargendler, tentou sabotar o uso deste meio mais democrático de comunicação. Entre outros retrocessos, ela fixou as mesmas restrições já existentes à propaganda eleitoral na TV e rádio, que são concessões do Estado. Ela também impôs que os candidatos só poderão ter um único site na rede, não podendo usar várias ferramentas de contato e interação com os eleitores.
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Apesar das restrições draconianas, a internet deverá ter papel ainda mais sobressalente na batalha eleitoral deste ano. Na sucessão presidencial de 2006, ela já foi essencial para se contrapor às manipulações da mídia hegemônica. O próprio meio de comunicação no ciberespaço dificulta as medidas restritivas e possibilita que as idéias e propostas circulem mais livremente, interagindo com a sociedade. Atrativos e com qualidade, as mensagens podem atingir um grande universo de pessoas. Um vídeo de Obama, por exemplo, teve mais de 20 milhões de visualizações em poucos dias. Sem dúvida, a internet é um novo e poderoso instrumento de luta de idéias na sociedade.
* Jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB - Partido Comunista do Brasil Leiam na íntegra em http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=34587

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

A nova geografia econômica do Brasil

De no Estado de São Paulo:
Paulo Roberto Haddad*

O Brasil vivenciou duas experiências grandiosas de reestruturação da distribuição espacial das atividades econômicas. No ciclo de expansão econômica dos anos JK, as atividades econômicas se concentraram, basicamente, no eixo Rio-São Paulo: de cada cem novos empregos industriais gerados pelo Plano de Metas, 72 se localizaram nesses dois Estados. No longo ciclo de expansão de 1968 a 1980, durante o regime militar, houve uma notável reversão da polarização e as regiões e os Estados menos desenvolvidos passaram a crescer mais rapidamente do que São Paulo e Rio de Janeiro.
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Em geral, quando se pretende definir quais são as potencialidades de crescimento econômico de uma região a partir da sua dotação de recursos naturais, é preciso estar ciente de que o conceito de potencialidade de recursos é econômico, e não físico. Ou seja, o valor de um recurso natural não é intrínseco ao material, mas depende da estrutura da demanda, dos custos relativos de produção, dos custos de transporte, das inovações tecnológicas que sejam comercialmente adotadas, etc.
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Da mesma forma que a abundância de recursos naturais pode não desencadear um processo de crescimento de uma região ou localidade e ampliar sua capacidade de exportar em escala global, a abundante oferta de mão-de-obra não qualificada ou semiqualificada pode também ser insuficiente para promover esse processo.
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Os empresários preferem localizar seus empreendimentos em países e regiões onde a rentabilidade dos investimentos seja maior. Quanto menor o salário-eficiência (índice de crescimento dos salários nominais dividido pelo índice de crescimento da produtividade), maior a capacidade competitiva da região e maior também o crescimento da produção regional. Como o crescimento dos níveis de salários nominais (entre trabalhadores desempenhando a mesma função) tenderia a ser praticamente igual em todas as regiões, tendo em vista a grande mobilidade destes entre as regiões abertas de uma economia nacional, os salários de eficiência tenderão a cair nas regiões (e nas indústrias particulares das regiões) onde a produtividade cresce mais rapidamente do que a média nacional.
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Do ponto de vista dos interesses econômicos e sociais das populações residentes nas áreas que se estão beneficiando dos novos projetos de investimento, é fundamental que transformem, a longo prazo, as experiências de crescimento econômico acelerado em processos de desenvolvimento sustentável.
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A tendência é de se seguir o denominado ciclo boom-and-bust econômico: nos primeiros anos, ocorre um rápido crescimento (boom) na renda e no emprego, seguido de um severo declínio (bust), resultado da própria exaustão relativa dos recursos naturais.

Somente o progresso científico e tecnológico, por meio das inovações de novos produtos, de novos processos e de novas técnicas de gestão, poderá permitir que venha a ocorrer um crescimento econômico com eqüidade social e sustentabilidade ambiental, pelo adensamento das cadeias de valor, pela capacidade de diferenciação de produtos de difícil replicabilidade, pela redução do salário-eficiência, pela melhoria da produtividade dos recursos naturais e pela maior qualificação do capital humano e das instituições regionais.

*Paulo Roberto Haddad, professor do Ibmec-MG, foi ministro do Planejamento e da Fazenda no governo Itamar Franco
Leiam na íntegra em http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20080818/not_imp225917,0.php

Os nomes do jogo

Deu no Congresso em Foco:
Márcia Denser*
Com o propósito de associar o dogma à realidade, ideologia à lógica, o neoliberalismo é o jogo que inventa novos nomes para velhas desgraças, eleva-as ao máximo e as vende de volta aos trouxas como bênçãos. Bilhões de trouxas. É bem verdade que a linguagem cria o pensamento e vice-versa, só que o mesmo não se dá com o real a não ser magicamente. Sem contar que o intelecto ao manusear valores apega-se a fórmulas vazias (o neoconservadorismo é o que?), conquanto idéias vivas possuam valor e substância, logo não é necessário se apegar a elas. Infelizmente o nominalismo mais canalha é a bola da vez, relegando o universalismo ao lixo conceitual.
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O contraste com a década de 60 é total: há quarenta anos a guerra ideológica entre as duas potências gerou idéias para abolir a pobreza do mundo e reabrigar os favelados. E hoje, o que temos? Um Pensamento Único e Um Favelão Estratosférico no lugar do que chamávamos mundo, emprego e futuro nenhum, aliás o futuro é atualmente o lugar mais perigoso da existência, melhor não pintar por lá em hipótese alguma!
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Os ideólogos neoliberais – também altamente borgianos, mas no pior sentido, pelo fato de aplicarem o realismo mágico discursivo à vida dos outros – chegaram a dizer que essa humanidade excedente era “uma colméia frenética de protocapitalistas cobiçosos por direitos formais de propriedade e pelo espaço competitivo não-regulamentado” – não é um primor retórico? Ainda bem que estão longe do ramo, esses caras batem de longe os ficcionistas.Sem contar que essa massa transbordante não consiste de proletários legais oprimidos mas de pequenos empresários extralegais comprimidos. Comprimidos onde? Em sua versão mais absurda, os ideólogos retro e supra chegam a redefinir favela como “sistema de gerenciamento urbano estratégico de baixa renda”.
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Em primeiro lugar, o emprego informal é ausência de poder de barganha, de regulamentos, direitos e contratos formais. De acordo com Jan Breman, a pequena exploração infinitamente franqueada, é sua essência. A falácia da “revolução invisível” do capital informal de Hernando de Soto na verdade se refere a uma miríade de redes invisíveis de exploração caracterizadas pela tecnologia antiquada, baixo investimento de capital, natureza manual da produção, elevada taxa de lucro não tributada.
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Em terceiro lugar, a informalidade garante o abuso extremo de mulheres e crianças.
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Em quinto, por enfrentar condições tão desesperadoras, os pobres apelam com cega esperança para uma “terceira economia de subsistência urbana”, que inclui o jogo, loterias e outras formas semimágicas de apropriação de riqueza. Indo no popular: aqui o nome do jogo é jogo do bicho, forma semimágica de apropriação de riqueza que no Brasil é mais velha do que andar para trás.
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Em síntese: a retórica demonizadora das várias “guerras” internacionais ao terrorismo, às drogas e ao crime são um apartheid semântico: constroem paredes epistemológicas ao redor das favelas que impossibilitam qualquer debate honesto sobre a violência cotidiana da exclusão econômica.

* A escritora paulistana Márcia Denser publicou, entre outros, Tango Fantasma (1977), O Animal dos Motéis (1981), Exercícios para o pecado (1984), Diana caçadora (1986), Toda Prosa (2002) e Caim (2006). Participou de várias antologias importantes no Brasil e no exterior. Organizou três delas - uma das quais, Contos eróticos femininos, editada na Alemanha. Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, é pesquisadora de literatura brasileira contemporânea, jornalista e publicitária.

Leiam na íntegra em http://congressoemfoco.ig.com.br/DetArticulistas.aspx?articulista=487&colunista=11

domingo, 17 de agosto de 2008

As três crises

Deu no Le Monde Diplomatique:
Cada vez mais intensos, os solavancos das finanças mundiais podem provocar crise sistêmica, e depressão semelhante à de 1929. A esta derrocada estão entrelaçadas a escassez de alimentos e da alta dos combustíveis. Vivemos as conseqüências de 25 anos de neoliberalismo. Mas quando diremos basta?
Ignacio Ramonet
Nunca havia acontecido antes. Pela primeira vez na história da economia moderna, três crises de grande amplitude – financeira, energética e alimentar – estão em conjunção, confluindo e combinando-se. Cada uma delas interage sobre as demais, agravando, de modo exponencial, a deterioração da economia real.
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Como temíamos, a crise financeira continua aprofundando-se. Aos descalabros de prestigiosos bancos norte-americanos, como o Bear Stearns, o Merrill lynch e o gigante Citigroup, somou-se o recente desastre do lehman Brothers, quarto maior banco de negócios, que anunciou, em 9 de junho, um prejuízo trimestral de 2,8 bilhões de dólares. Como foi a primeira perda desde o lançamento de suas ações na Bolsa, em 1994, o resultado teve efeito de um terremoto financeiro, nos já violentamente traumatizados EUA.
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A crise começou nos Estados unidos, em agosto de 2007, com a desconfiança nas hipotecas de má qualidade (subprime) e propagou-se por todo o mundo. Sua capacidade de se transformar e se espraiar por meio da contaminação de complexos mecanismos financeiros faz com que se assemelhe a uma epidemia fulminante, impossível de controlar. As instituições bancárias já não emprestam dinheiro entre si. Todas desconfiam da saúde financeira de suas rivais.
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Da esfera financeira, o problema passou para o conjunto da atividade econômica. De um momento para outro, as economias dos países desenvolvidos sofreram um desaquecimento. A Europa encontra-se em franca desaceleração e os Estados Unidos estão à beira da recessão.
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Da crise financeira passamos à crise social. E políticas autoritárias voltaram a surgir. O Parlamento Europeu aprovou, em 18 de junho passado, a infame “diretiva retorno” [1]. Imediatamente, as autoridades espanholas declararam sua disposição em favorecer a saída da Espanha de um milhão de trabalhadores estrangeiros...
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Como se todo esse contexto não fosse bastante sombrio, a crise alimentar agravou-se repentinamente e chega para nos lembrar que o espectro da fome continua ameaçando quase um bilhão de pessoas. Em cerca de 40 países, a carência de alimentos provocou levantes e revoltas populares. A reunião de cúpula da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), foi incapaz, em 5 de junho, em Roma, de chegar a um consenso para retomar a produção de alimentos no mundo. Aqui também os especuladores, fugindo do desastre financeiro, têm parte de responsabilidade — porque apostam num preço elevado das futuras colheitas. Até mesmo a agricultura está se “financeirizando”.

Este é o saldo deplorável de 25 anos de neoliberalismo: três veneosas crises entrelaçadas. Já está na hora de os cidadãos gritarem: “Basta!”.

Leiam na íntegra em http://diplo.uol.com.br/2008-08,a2516

domingo, 10 de agosto de 2008

Ossétia do Sul: Começou a guerra

Deu no Resistir.info:
Na noite de 7 de Agosto, forças georgianas lançaram um ataque a Tskhinvali, o qual Tíflis cinicamente descreveu como um esforço para restaurar a ordem constitucional. Poucas horas antes, Sasskashvli declarou um cessar fogo na zona de conflito, mas o movimento era apenas uma manobra de propaganda que disfarçava o plano para uma ofensiva em grande escala. O momento foi cuidadosamente escolhido — a atenção mundial está voltada para a abertura dos Jogos Olímpicos, o primeiro-ministro russo V. Putin está em Pequim, e o presidente russo D. Medvedev está numas férias curtas.
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A ofensiva já fez dezenas, se não centenas, de mortos. No entanto, parece que a actividades das forças de manutenção da paz permanece limitada à monitorização da situação. A sua inacção ajuda o agressor — o lado georgiano declara que a força russa de manutenção da paz não está a intervir no conflito. O exército da Ossétia do Sul respondeu ao fogo, mas não tem potencial comparável àquele das forças georgianas. Várias aldeias da Ossétia já foram capturadas e há possibilidade de que a auto-estrada Zar que liga a Republica à Rússia seja bloqueada.
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É simbólico que Tíflis tenha lançado a agressão no aniversário da queda da República Krajina da Sérvia. A sua morte tornou-se o prólogo para a fase seguinte da guerra balcânica – para a guerra no Kosovo, os ataques da NATO à Sérvia e a humilhação da partição do país. Já foi dito muitas vezes que o Ocidente está a re-utilizar o cenário balcânico no Cáucaso, e que desta vez planeia-se que a Rússia desempenhe o papel da Sérvia. Políticos de Belgrado que 13 anos atrás disseram que vendendo seus compatriotas na Croácia e na Bósnia impediriam a agressão ocidental agora pretendem que estavam inconscientes de que chegaria a vez da Sérvia após os sérvios na Croácia e na Bósnia.
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A situação pode ficar fora de controle e evoluir para condições em que as autoridades federais serão incapazes de controlar não só as actividades de líderes informais e as máfias dos seus seguidores como também aquelas dos chefes das repúblicas do Cáucaso do Norte que – se a escalada continuar – começarão a actuar independentemente e tentar de alguma forma estabelecer controle sobre o processo. O presidente da Ossétia do Norte, Taymuraz Mamsurov, já disse que centenas de voluntários estão a caminho da Ossétia do Sul. Disse ele: "Não podemos travá-los". Pessoas de outras republicas do Caúcaso do Norte e da Abkhazia estão prontas para fazer o mesmo. Às 4 horas da manhã de 8 de Agosto, os guarda fronteiras na Ossétia do Norte não relataram forças russas a cruzarem a fronteira.
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Tristemente, as advertências acerca das consequências negativas a longo prazo da passividade da diplomacia russa para tratar a questão das repúblicas não reconhecidas não tiveram efeito apesar de terem sido reiteradas durante anos. A verdade óbvia de que a autoridade georgiana tão pesadamente armada pelo Ocidente não está a enganar e algum dia irá até o fim foi simplesmente ignorada. Tal como em 1992 e 1993, é a Rússia que terá de enfrentar os problemas resultantes, sendo a diferença que o exército georgiano de hoje é algo muito mais sérios do que as gangs de Kitovani e Ioseliani .
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Agora, só medidas urgente podem remediar a situação. A Rússia deveria romper imediatamente relações diplomáticas com a Geórgia e, caso a agressão continue, efectuar ataques aéreos contra as forças georgianas na Ossétia do Sul (incluindo o corredor Liakhv o qual é o principal recurso estratégico da Geórgia na república de facto).
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A seguir ao retorno ao status quo — desta vez assegurado pela força — a Rússia deveria formar imediatamente uma aliança de defesa com a Ossétia do Sul e a Abkhazia, e o parlamento russo deveria estabelecer o status das repúblicas como sujeitos associados dentro da Federação Russa.
08/Agosto/2008

Ver também: http://ossetians.com/eng/
O original encontra-se em http://en.fondsk.ru/article.php?id=1530
Leiam na íntegra em http://www.resistir.info/russia/ossetia_08ago08.html