O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.
Joaquim Nabuco, 1849-1910

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segunda-feira, 10 de março de 2008

Justiça rápida depende de vontade política

Deu no Correio do Brasil:
por
Sergio Couto - do Rio de Janeiro
“La ley es como el cuchillo; no corta quién la maneja"
(José Hernandez in Martín Fierro)
A justiça brasileira, emaranhada em suas próprias teias, está fadada a continuar sendo o que, lamentavelmente, sempre foi, lenta, emperrada, de freio puxado ao obter resultados. Passam-se os anos e a sua sina se mantém, olimpicamente, inalterada, como se o fenômeno do atraso não mais surpreendesse a ninguém. Faz parte da rotina forense!
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Uma grande contrariedade, como por exemplo, um processo perdido, pode transformar um homem de 60 anos num indivíduo senil, tanto física quanto moralmente, como observa Simone de Beauvoir (in “A velhice, ed.Nova Fronteira, p.41).

Todo processo que se inicia traz ínsito o fantasma da falibilidade da justiça por não materializar a solução no tempo certo . Não deveria ser assim .Justiça rápida é o objetivo de todos que atuam nessa seara, porque constitui a última trincheira dos injustiçados, forma derradeira de o cidadão garantir os seus direitos que vem sendo desrespeitados ou postergados por outrem. Mais do que qualquer outra instância estatal, há de ser merecedor de plena credibilidade que se assenta no princípio da celeridade. Mas como consegui-la?
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As modificações processuais recorrentes, visando à suposta celeridade não tangenciam , com a mais respeitosa vênia, a raiz do problema, porque se trata de algo sistêmico ligado a crônicas injunções políticas. Nos seminários acadêmicos esboçam-se esforços heróicos para discutir a inovação legislativa de plantão, capaz de por cobro a tão angustiante problema. Certamente, em vão!
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Sejamos francos. Toda vez que acontecem estudos e palestras nos seminários jurídicos, nomes de escol são relacionados, segundo o tema de sua especialização. Os auditórios ficam repletos, ávidos, com justa razão, em abeberar as lições dos mestres, que se mostram repassadas de notável sabedoria.
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Quando se constata, porém, que o equacionamento do tema ligado à celeridade se insere muito mais na área política do que jurídica, a tendência natural é postergá-lo , pela natural impotência de quem não tem forças para agir, até mesmo por impossibilidade de acesso ao legislador . Este, certamente, sempre tem outras prioridades a tratar, e, nesse passo, vamos convivendo com o quadro crônico de espera sem fim, que vitimes o jurisdicionado.
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O juiz prolata uma sentença, depois de exame percuciente dos autos. É o juiz natural da causa. Sopesa argumentos das partes em conflito. Ouve testemunhas. Determina perícias e encerra a questão, estando o feito maduro para isso. Acontece que a lei permite recurso ao tribunal, formado o órgão julgador por uma câmara isolada, composta de três desembargadores que vão novamente reexaminar tudo, para confirmar a decisão ou reformá-la.
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Não atemoriza ao sucumbente o risco de pagar multa processual (ou ter de enfrentar, agora, custas processuais de monta), caso o recurso não seja conhecido ou provido, e nem se abalança em saber que uma vez confirmada a decisão de primeiro grau, esta se torna auto-executável para todos os fins, segundo o comando do art. 475 da legislação processual.
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O absurdo de mais uma instância revisora solta aos olhos. São apenas 33 ministros, estóicos, honrados e competentes que integram o STJ, que jamais colocarão o serviço em dia, porque sobre seus hercúleos ombros, que se reconhece, pesam milhares de processos vindos de todos os tribunais do país, transcendendo suas forças físicas. E os diligentes assessores que integram os gabinetes, facilitando os trabalhos de pesquisa, não poderão igualmente minimizar a pletora de feitos que sobrecarregam a Corte.
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Os números atestam, com eloqüência, a força de trabalho dos juízes fluminenses, certo ainda que a justiça de outros Estados, acompanham no mesmo passo tal produção, com algumas variações, fazendo desaguar na corte infraconstitucional milhares de processos a serem reexaminados por apenas três dezenas de dedicados julgadores.
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A Suprema Corte, também congestionada, com apenas 11 ministros, da mais alta qualidade moral e intelectual além de notável espírito público, bem que poderia contar com a colaboração dos 33 ministros da corte infraconstitucional que passariam a integrá-la, num total de 44 magistrados. Julgariam, tão somente, pela sua relevância, matéria de índole constitucional.

Abre-se pequeno parêntese para assinalar que recentemente um dos magistrados que integrava o STJ, insigne Min. Carlos Alberto Direito, foi nomeado para integrar a Suprema Corte, o que reforça a tese da possibilidade de fusão entre os dois tribunais, pelo notável saber jurídico e reputação ilibada, que caracterizam os eminentes membros das duas Casas.
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A presente proposta está alicerçada na crença de que temos magistrados da melhor qualidade técnica, com grande capacidade de trabalho, como revelam as estatísticas referidas acima. Se, eventualmente, erram, o que é humano, o órgão revisor imediato saberá corrigir, porque, afinal, o feito será reexaminado pelo Tribunal.
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Acontece que houve recurso para o STJ, que ao julgar o HC 72941, relatado pela Ministra Maria Thereza de Assis Moura, proclamou “nulos os julgamentos de recursos proferidos por Câmara, composta majoritariamente, por juízes de primeiro grau, por violação ao princípio do juiz natural”, informando que questão símile fora levada ao Conselho Nacional de Justiça, arquivada no dia 17 de abril de 2007.
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Diante das graves circunstâncias, o tribunal paulista tomou uma grave e heróica decisão, nos limites de suas forças, ao fazer a corajosa convocação, por não mais suportar a angustiante massa de milhares de processos, que tanto faz desacreditar aos que ainda crêem na justiça.
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O esgotamento das possibilidades de conciliação, sempre documentada, registrando as reuniões, tentadas, entre as partes e seus advogados e, num segundo momento, com a intervenção de um Magistrado, à semelhança do juízo prévio americano, certamente inibiria o ajuizamento de novas ações.
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A confirmar e reforçar o que se disse até aqui, registre-se que oitenta por cento de sentenças de primeiro grau são confirmadas nos tribunais superiores, como informa MOZART VALLADARES , recém-empossado na Presidência da AMB, em longa entrevista prestada ao JB, de 26 de dezembro de 2007,País, A3.
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É preciso fazer algo para reverter a situação, até porque o imaginário popular, por não confiar na Justiça, acredita em trabalhos de “simpatia”, para dar andamento a processo , recomendando: “junto ao tronco de uma árvore frondosa, faça um buraco no chão e enterre um papel com o número do processo. Feche o buraco com a terra e coloque por cima uma vela acesa. Quando o processo começar a andar, volte ao mesmo lugar, desenterre o papel e acenda uma vela para almas benditas. Guarde o papel! (in Coluna do Antonio Carlos, jornal “Extra”, 14 de janeiro de 2008, p.2).
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Dizia Kennedy que a “mudança é uma lei da vida. Aqueles que olham apenas para o passado ou para o presente, certamente perderão o futuro”. É preciso ousar, para corrigir!.

“Se as coisas são inatingíveis...Ora! Não é motivo para não querê-las...Que tristes seriam os caminhos, se não fora a mágica presença das estrelas”.(MÁRIO QUINTANA).
Sergio Couto é advogado.
Leia na íntegra em http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=135138

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