O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.
Joaquim Nabuco, 1849-1910

Arquivo do blog

terça-feira, 6 de maio de 2008

Modelos para o Brasil: Tigres asiáticos?

Deu na Revista Espaço Acadêmico. N. 84, ano 7, maio 2008, edição especial ISBN 1519-6186:
por
João Fábio Bertonha
Escrever a respeito dos chamados “tigres asiáticos” é bastante complicado, pois o próprio termo é sujeito a interpretações diversas. Alguns economistas, por exemplo, acreditam que Japão, China e até a Índia poderiam ser incluídos nesta rubrica. Para outros, poderíamos falar dos tigres “clássicos”, como Hong Kong, Coréia do Sul, Taiwan e Cingapura e dos neo-tigres, como Tailândia, Malásia, Indonésia e Filipinas. Tal amplitude do termo pode dar margem a confusões, pois, se é verdade que a experiência asiática tem muitos pontos em comum, não é possível associar países em estágios de desenvolvimento diversos numa análise única.
[ . . . ]
E é uma experiência que merece realmente ser conhecida e analisada. Entre 1960 e 1995, estes países multiplicaram sua renda per capita por oito, enquanto os da América Latina apenas a duplicaram. Todos os índices sociais cresceram junto com o aumento da produção e das exportações e estes países estão, hoje, no rol dos desenvolvidos ou, no mínimo, chegando perto.
[ . . . ]
O Estado, neste contexto, interveio em peso para promover as exportações. As nascentes empresas receberam incentivos fiscais, crédito barato, subsídios, proteção cambial e outras benesses. O Estado também procurou investir na infra-estrutura e na formação de capital humano, com maciça inversão de recursos na educação superior e na ciência e tecnologia, mas, acima de tudo, na educação básica e média. Ao mesmo tempo, o Estado manteve disciplina fiscal, inflação baixa e práticas de livre mercado, como preços livres e a concorrência. O próprio foco no mercado internacional, além disso, obrigou as empresas nacionais a ser competitivas.
[ . . . ]
Nesse ponto, vale uma comparação com o Brasil. Durante alguns anos, por exemplo, tivemos uma reserva de mercado para a informática. As empresas nacionais que surgiram à época se acomodaram e, mesmo que tivessem tentado sofisticar seus produtos e exportar, esbarrariam em dificuldades de financiamento, escassa mão-de-obra qualificada, etc. O resultado foi uma indústria de computadores tímida, acomodada e que entrou em crise logo que as barreiras alfandegárias caíram.
[ . . . ]
Em 1997/1998, uma severa crise atingiu os tigres asiáticos. Para os liberais, uma prova de que intervencionismo estatal não funciona e que as leis de mercado finalmente trabalhavam para colocar os asiáticos no seu devido lugar. Os liberais tinham razão quando ressaltavam que o sistema financeiro dos tigres asiáticos estava cheio de problemas e defeitos, como pouco rigor em empréstimos, uma relação quase incestuosa com as empresas, etc. Também tinham razão ao indicar que uma economia moderna demanda um sistema bancário menos concentrado, com critérios mais sérios para concessão de empréstimos, etc.
[ . . . ]
O enfraquecimento da moeda permitiu uma rápida expansão das exportações e os governos asiáticos reduziram os juros e começaram a gastar dinheiro público para sanear o sistema financeiro e estimular a economia. A própria disciplina fiscal desses países permitiu, aliás, que eles se permitissem um momento de liberalização das finanças públicas num momento crítico. Isso apenas revela como seguir o receituário liberal ao pé da letra nem sempre produz resultado, mas como segui-lo em parte pode ser muito produtivo em alguns casos.
[ . . . ]
O que podemos aprender da experiência dos tigres asiáticos? Em primeiro lugar, a necessidade de uma sinergia entre um Estado minimamente eficiente (o que não significa esquecer o caráter corrupto e autoritário da maioria desses países nas últimas décadas) e capaz de conduzir um projeto nacional com um setor privado forte e competitivo. Em segundo, como não se constrói um país moderno sem ciência, tecnologia e educação, mas como estas precisam estar inseridas no sistema produtivo, sob risco de desperdício de potencial humano. Por fim, que valores como os dos asiáticos (trabalho, disciplina, visão de futuro) são fundamentais para o desenvolvimento, mas que o desenvolvimento é possível em qualquer lugar. Isso, claro, desde que as elites que tomam as decisões não se contentem com a sua riqueza e poder, mas desde tenham vontade de ver o país como um todo crescer, adotando as políticas adequadas para tanto.
* João Fábio Bertonha, Doutor em História, Professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Maringá/PR e Pesquisador do CNPq. e-mail: fabiobertonha@hotmail.com
Leia na íntegra em http://www.espacoacademico.com.br/084/84bertonha.htm

Nenhum comentário: