O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.
Joaquim Nabuco, 1849-1910

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quarta-feira, 26 de setembro de 2007

O nacionalismo revolucionário

Deu na Adital:
Elaine Tavares *


Adital -
O nacionalismo sempre foi razão suficiente para os Estados-nacionais latino-americanos empreenderem transformações radicais na organização da vida. Foi na defesa da "nação" que iniciaram os movimentos de independência, ainda que naqueles dias o conceito fosse mais abrangente, uma vez que Bolívar sonhava com uma Pátria Grande, que aglutinasse um conjunto de países. De qualquer forma, as guerras tinham como objetivo primeiro assegurar a soberania dos povos desta parte do mundo diante da colônia. Era uma afirmação da nação.
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E hoje, quando se fala nos governos da Venezuela, Equador e Bolívia, tampouco se pode fugir do conceito de nacionalismo, embora os adversários e inimigos dos governantes em questão insistam em chamar de populismo a forma que eles encontraram de defender os interesses nacionais. Mas, na verdade, a nacionalização das riquezas, a valorização das culturas autóctones e a participação popular direta nada mais são do que elementos de uma receita que os países ricos sempre aplicaram para si, embora não admitam ver florescer nos países ditos "subalternos": o nacionalismo.
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Na América Latina, afirma o professor, o desenvolvimento capitalista apresenta um estado, estrutura de classe e economia muitos particulares. Aqui, burguesia e proletariado não existem de forma tão marcada. Na América Latina a burguesia é incompleta e, por isso, a análise tem de ser muito mais detalhada. "A nossa burguesia não fará a revolução. Ela rompe com o povo e se alia com o imperialismo. Tampouco há um proletariado forte. Dois terços dos trabalhadores não têm carteira assinada e ainda existe o MST que aglutina milhões de pessoas num processo que não cabe no capitalismo. Aqui temos um desenvolvimento no subdesenvolvimento e a relação de trabalho é quase feudal".
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Quando o populismo está hegemonizado pelos trabalhadores, segue o professor, a primeira coisa que os poderosos fazem é condenar o nacionalismo que quase sempre lhe está colado. Mas, isso só ocorre na periferia, pois nos países centrais ninguém se atreve a colocar em questão o nacionalismo. Quem questiona o fervor com que os estadunidenses defendem sua pátria? Então, reforça Nildo, o nacionalismo só pode ser uma arma das classes subalternas se, hegemonizado por elas, caminhar para uma revolução. Assim, as idéias nacionais que hoje tomam conta da Venezuela, Bolívia e Equador, se ainda aparecem apenas como populismo, há que se prestar bastante atenção para ver quem hegemoniza esse debate. Se são as gentes, o povo, os trabalhadores das mais variadas classes (as tantas que existem na América Latina, visto que o proletariado clássico tem pouca expressão), tudo leva a crer que o processo se radicalize, e siga sempre pendendo para o "fora da ordem".
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Na Venezuela, Bolívia e Equador, as comunidades indígenas, os trabalhadores informais, os camponeses, os desempregados são os que parecem estar na frente do processo. Daí as crises com o sindicalismo que, em outros tempos, era quem comandava as lutas. Hoje, na Venezuela, depois de anos sendo nada mais do que apêndices de governos corruptos e entreguistas, ou aristocracias laborais, os trabalhadores sindicalizados começam a correr atrás da hegemonia e encontram dificuldades. Ficaram muito tempo longe das demandas populares e foram ultrapassados pelas gentes que se organizam nos bairros, nos círculos bolivarianos etc.
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O certo é que a luta de classes está mais do que viva nesta Abya Yala. Nos países mais ao norte da América do Sul, ainda há uma disputa acirrada no que diz respeito à hegemonia do processo, mas não dá para deixar de perceber que as reformas empreendidas seguem o rumo do nacional, da defesa dos recursos naturais, da recuperação da soberania, da busca da descolonização e da independência.
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Enquanto isso, anestesiados com a idéia de que são governo, algumas lideranças de trabalhadores - principalmente as ligadas ao sindicalismo - perdem o contato com a realidade e não percebem que estão deixando escapar a possibilidade de tomar nas mãos o processo que iniciou com forte caráter popular. Por outro lado, os movimentos sociais que aglutinam sem-terra, desempregados, informais etc..., ainda não encontraram o caminho para a conquista da hegemonia. Assim, a lógica de Lula de tentar conciliar classes em conflito e a clareza que se tem de que não são as gentes trabalhadoras as que comandam o timão são elementos seguros de análise que levam a seguinte conclusão: ainda não estão dadas as condições para uma viragem significativa no Brasil. Muito trabalho ainda precisa ser feito para que o povo encontre seu lugar de poder no processo político brasileiro.

* Jornalista
Leia na íntegra em
http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=29702

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