O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.
Joaquim Nabuco, 1849-1910

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sábado, 13 de outubro de 2007

Teoria econômica e pedágios

Deu no Paidéia Gaúcha:

Fiquei uns dias fora do ar, quero voltar debatendo um tema que tem ocupado jornais e TVs regionais e nacionais. Não, não é o affair Renan, mas a questão das concessões de rodovias, os (im)populares pedágios.

Ouvimos, recorrentemente, durante as últimas décadas do século XX, que não havia alternativa à teoria que conferia ao mercado superioridade, em relação ao Estado principalmente, na gestão dos recursos econômicos. Alcunhou-se esta teoria, no ambiente político, de neoliberalismo e no ambiente econômico acadêmico de teoria econômica neoclássica. Seu pressuposto fundamental é o de que economias competitivas são levadas pelos mecanismos de livre mercado e livre competição, automaticamente, a melhor alocação possível de seus recursos. Em economia esta melhor alocação tem até um nome: "ótimo de Pareto". É o ponto em que não é possível mais melhorar a situação de um agente econômico sem piorar a situação de outro. Ou seja, os recursos estão alocados da melhor maneira possível, não é mais possível melhorar a situação de todos os agentes... Se o objetivo é beneficiar a economia como um todo, atingir o "ótimo de Pareto", o melhor seria, segundo esta teoria, apostar quase (para ser generoso) que exclusivamente no mercado.

Esta teoria fez-se diagnóstico e prescreveu remédios. O diagnóstico foi o de que as economias em que os recursos não estavam alocados da melhor maneira possível ("pareto-ineficientes"), menos competitivas, assim estavam em função da intervenção excessiva do Estado. Esta excessiva intervenção estaria aprisionando as forças da livre competição, do livre mercado. Mercado aprisionado, alocação ineficiente de recursos. A saúde seria recobrada quando o mercado votasse a comandar as relações econômicas. O remédio para isto veio sob a forma de recomendação de diversas políticas econômicas, entre elas:

a) Austeridade fiscal;
b) Juros altos;
c) Liberalização comercial;
d) Liberalização da conta de capital e dos mercados de capitais;
e) Privatização;
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Segundo os estudos de Stiglitz, os mercados são, via de regra, "pareto-ineficientes", ou seja, não levam a melhor alocação possível dos recursos econômicos, não levam a situações de organização mais eficiente da economia. Além disso, os mesmos estudos apresentaram situações em que a intervenção do Estado pode melhorar a economia toda. Vou recorrer a um bom texto da Wikipédia, apresentado abaixo em itálico, para resumir as conclusões de Stiglitz:

Todas as decisões econômicas precisam de informação. Stiglitz demonstrou que, em economias de mercado, a aquisição de informação está longe de ser perfeita (uns a obtém com mais facilidade que outros), bem como demonstrou que a maior parte dos ganhos obtidos através da obtenção de informação é composto por "rents", ou seja, ganhos de uns às custas de outros, o que não beneficia a economia como um todo. Isto é exatamente o contrário do "ótimo de Pareto".
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"Suponha que durante uma aula, como por milagre, 100 notas de 50 reais caíssem do forro, cada uma exatamente no pé esquerdo de cada aluno. Evidentemente os alunos poderiam esperar a aula terminar para apanhar o dinheiro a seus pés. Essa espera não alteraria em nada seus benefícios. Mas isso não seria um "equilíbrio de Nash": se todos os alunos fizessem isso, poderia ser beneficiado qualquer "espertinho" se agachasse imediatamente e apanhasse todas as notas que conseguisse do chão. Cada aluno individualmente, percebendo essa possibilidade, se abaixa para apanhar as notas ao mesmo tempo. O equilíbrio assim obtido não coloca nenhum dos alunos, nem a classe toda, em uma situação melhor do que se tivessem todos aguardado o fim da aula para apanhar o dinheiro - mas criou um "custo social imenso"; nesse exemplo, representado pela interrupção da aula. Existem potencialmente muitas outras ineficiências geradas pela aquisição da informação." Stiglitz, "Aula Magna"
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Entregar ao mercado a tarefa de alocar recursos, no mais das vezes, não levará sempre a melhor situação alocativa. Os estudos de Stiglitz revelaram que determinadas intervenções (governamentais) nos mercados poderiam beneficiar a economia como um todo e, por conseqüência, todos os indivíduos nela envolvidos.
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Será que não está na hora de parar de fazer eco ao receituário econômico da eficiência alocativa superior dos mercados? Parar de achar que privatizar é sempre, em qualquer momento, a melhor escolha? Para, após, ao menos ouvir as recomendações de economistas como Stiglitz que, mesmo crendo no mercado como instrumento de alocação de recursos em alguns casos, sabem que antes de entregar áreas econômicas inteiras ao seu domínio é preciso contar com instituições fortes, com um Estado organizado e capaz de corrigir as imperfeições do mercado. Nosso Estado é capaz de fazer isto, que é o mínimo? Creio que, infelizmente, não.
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Em nível federal é, no mínimo, ingenuidade - perigosa ingenuidade - achar que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) terá a capacidade de conter as demandas futuras por aumento nas tarifas de pedágio. Não consegue sequer fazer, com autonomia em relação as empresas privadas, bons orçamentos para os leilões de concessão de rodovias, quanto mais fiscalizar depois...

Qual alternativa? Se você fez esta pergunta, atingi meu objetivo. A partir daí podemos começar a pensar...

Postado por Andre Passos às 19:41 0 comentários
Leia na íntegra em http://paideiagaucha.blogspot.com/2007/10/teoria-econmica-e-pedgios.html

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